20 maio 2023

Entenda como a educação inclusiva sai do papel e acontece no interior da Bahia

Educação inclusiva para as pessoas com deficiência é respaldada pela Lei Brasileira de Inclusão (Lei 13.146). Contudo, para se tornar efetiva essa regulamentação, precisa de mais recursos para garantir o direito à acessibilidade, explicitamente em Seabra, no interior da Bahia.

Aprovada há sete anos, a lei regulamenta a garantia de uma educação inclusiva para as pessoas com deficiência e fomenta o debate sobre os recursos para a acessibilidade. Pela regulamentação, é proibida a cobrança adicional para implementar o acesso e o atendimento em “escolas regulares” de ensino fundamental e médio. A lei pretende viabilizar o acesso aos locais e a permanência em um espaço adaptado e eficiente para as pessoas com dificuldades de acessibilidade. 


Organizações lutam para garantir educação inclusiva. 

De acordo com o censo de 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 24% da população apresentam dificuldades visuais, auditivas, motoras ou intelectual. Mesmo assim, os dados apontam que as cidades não estão adaptadas para atender essas pessoas, uma vez que apenas 11,7% das frotas de ônibus intermunicipais estão totalmente adequadas para essas pessoas. Quando se trata de educação, o cenário de exclusão também se perpetua.

Esse cenário acontece em Seabra, cidade do interior da Bahia, localizada na Chapada Diamantina. Com 44.370 habitantes, a malha educacional conta com 69 escolas no geral, 60 distribuídas em rede municipal e zona rural. Na sede, há três particulares, quatro Estaduais, além do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia - Campus Seabra. Uma coleta realizada pelo Aprimoramente indica que as instalações de acessibilidade variam entre os colégios, enquanto algumas apresentam os três pilares: “escola, sanitários e dependências acessíveis”. Outras, apenas, têm sanitários adaptados.

Condições de acessibilidade nas escolas de Seabra (BA)


Aos 38 anos, Gisele de Souza Barros é mãe do adolescente João de Souza Rios e reside em Seabra. Com 12 anos, João é deficiente auditivo e estuda na Escola Família Agrícola. A experiência escolar junto do filho reflete a realidade das dificuldades em garantir o acesso à educação inclusiva, pois João não recebeu acompanhamento de um tradutor ou intérprete de libras, quando estudava em escola privada. “Apenas quando ele ingressou na escola pública, no Fundamental 1, segundo ano, que o poder público municipal nos forneceu esse acompanhamento e, desde então o mesmo professor de Libras, Célio Felix, que o acompanha sempre”, conta.

                                           Foto: João de Souza em atividade escolar

Para a mãe de João, o cenário de acessibilidade mudou ao longo dos anos. Hoje, são os ambientes que se adaptam ao filho, que irá cursar o sétimo ano em 2023, e não o contrário. A realidade vivenciada por João é o que o direito constitucional à educação deve garantir e visa como direito social. “Inclusão não é matrícula. Inclusão é dar oportunidade para que dentro da sua limitação o aluno avance." Salienta Gisele.  Essa discussão também foi fomentada pela Lei Brasileira de Inclusão.

Escola Pública Garante Educação Inclusiva

A diretora da Escola Família Agrícola, Magnólia Rosa de Oliveira Almeida, 50, afirma que as adaptações no ambiente escolar foram acontecendo assim que discentes e docentes abraçaram, nas suas palavras, o “desafio” de incluir uma pessoa com deficiência inclusiva na escola.Foi o que aconteceu no momento em que João foi matriculado. “A gente é movido por desafios, resolvemos abraçar e estamos aprendendo muito, tanto com o nosso aluno, quanto com o seu tutor, o instrutor de Libras, que sempre está com ele.”, diz Magnólia.

Segundo a diretora Magnólia, no começo da jornada uma estratégia não havia sido traçada, apontando que entre as barreiras se encontra a falta de tempo para que o professor e diretor realizem uma formação que contribua com a educação inclusiva. Por lei, escolas públicas e privadas devem oferecer “profissionais de apoio escolar” legalmente formados, os quais devem atuar em todas as atividades que o aluno necessita. Com isso, a pessoa com deficiência pode alcançar seu máximo desenvolvimento segundo seus interesses e necessidades, objetivo da lei constitucional.

Professor de História, Felipe de Farias é orientador educacional com especialização em Neuropsicopedagogia e diretor temporário do Fórum de Educação Inclusiva e Acessibilidade de Seabra-BA. Ele reconhece a importância de ter o Atendimento Educacional Especializado (AEE) e afirma que "Seabra conta com algumas salas de recursos multifuncionais, com alguns profissionais multidisciplinares e docentes de AEE”.

                                   Felipe de Farias na "Semana em Prol da Pessoa com Deficiência" 

Segundo a Legislação Brasileira de Inclusão, o profissional lotado no setor de AEE deve identificar as necessidades do aluno, visando contribuir com o desenvolvimento da educação inclusiva e oferecer suporte ao professor da classe comum. A sala deve ter recursos multifuncionais, ambientes dotados de equipamentos mobiliários, materiais didáticos e pedagógicos para a oferta do atendimento educacional especializado.

O AEE tem a função de identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade. O profissional deve planejar o atendimento dos alunos portadores de necessidades especiais no período oposto ao turno escolar. Se o aluno estuda pela manhã, será prestado o AEE durante à tarde. Ele contempla o ensino comum. É importante lembrar que o AEE não é um reforço escolar, mas um recurso que visa aprimorar o processo de obtenção de conhecimento por parte de alunos com necessidades especiais.

O professor Felipe de Farias analisa a diferença do acesso à educação inclusiva entre a rede pública e privada, concluindo que a escola pública garante os serviços educacionais especializados, devido a dispor de equipe capaz de somar na vida de cada estudante com deficiência. “Educação inclusiva é cara e o sistema privado sempre tenta eliminar custos extras”, afirma.

Apesar dos desafios enfrentados por mães e alunos com deficiência, o Atendimento Educacional Especializado é uma possibilidade de construir uma educação inclusiva, devendo ser garantido pelo Estado e todas as escolas, sejam privadas e públicas.

Reportagem especial para a Série "Acessibilidade para além das barreira: a luta por direitos por Ana Novaes, de Seabra (BA), para Agência MultiCiência