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Em tempos de isolamento social, as tecnologias facilitam a vida das pessoas, permite aproximações e torna a rotina menos entediante. Parentes e amigos interagem por meio do WhatsApp, Facebook e Instagram e utilizam aplicativos de videoconferência como o Hangouts, Zoom e Skype para conversar, marcar reuniões e para o lazer e entretenimento. Inofensivo aos nossos olhos, o mundo virtual conecta 3,1 bilhões de usuários ativos, segundo Hootsuite do We Are Social, do ano de 2018. Não pagamos nada ao utilizar as funcionalidades, contudo nos tornamos parte do produto. As empresas coletam informações e hábitos de consumos para gerar propaganda. Mas será que estamos dispostos a disponibilizar a nossa geolocalização ao governo para combater o novo coronavírus?
A Coreia do Sul se destaca no controle à pandemia a partir do uso da geolocalização. Os coreanos utilizaram um sistema conhecido como contact tracing (rastreamento de contato) que permite identificar o paciente contaminado pela Covid-19, rastrear os locais por onde passou e as pessoas com quem teve contato e fazer o isolamento seletivo destes indivíduos sem a necessidade de medidas drásticas. Países da União Europeia adotaram sistemas semelhantes de rastreamento de dados.
No Brasil, mais da metade dos Estados aderiu ao uso de ferramentas de geolocalização criadas pelas operadoras de telefonia Vivo, Claro, Oi e Tim ou por staturps de tecnologia para enfrentar o novo coronavírus. O governo de São Paulo utiliza dados de celulares para localizar aglomerações. No Recife o mapeamento permite que faça o isolamento seletivo deste indivíduos sem adotar medidas drásticas, como o lockdown.
Atualmente, existe o rastreamento de dados por localização agregados e anonimizados, do qual o índice de distanciamento mede o percentual das pessoas que estão em casa ou sem se deslocar. A Apple e o Google propõem o monitoramento e exposição de pessoas infectadas, a partir da utilização do Bluetooth. Nesse sistema, é possível identificar com quem o paciente com a Covid-19 se encontrou e o sistema envia informes por SMS para essas pessoas. Como exemplo dessa prática é aplicativo Dycovid Dynamic Contact Tracing desenvolvido pelo governo de Pernambuco, do qual Petrolina já faz o uso dele. Um outro tipo de rastreamento é o monitoramento e exposição de todas pessoas infectadas, nesta modalidade o nome de cada pessoa infectada fica disponível.
Empresa como a Startup In Loco, localizada no Porto Digital em Recife, coleta dados de geolocalização para identificar as aglomerações nos estados de Alagoas, Amapá, Amazonas, Ceará, Maranhão, Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Piauí, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e as prefeituras de Teresina (PI) e Aracaju (SE). A empresa disponibiliza um módulo de software, integrado em aplicativos de parceiros e clientes - bancos e grandes varejistas, por exemplo. Para o cientista de dados da In Loco, Luciano Melo, “os usuários que voluntariamente instalam esses aplicativos, podem ou não permitir a coleta de dados, seguindo parâmetro das finalidades previstas na Política de Privacidade. A única informação coletada é a localização do dispositivo móvel (celulares), utilizada para fins de autenticação e verificação de segurança e anti-fraude, além de contagem de visitas em determinados estabelecimentos”. O processo de coleta não permite a identificação de dados pessoais, como nome, RG, CPF, e-mail. “Os dados de localização coletados são anonimizados, agregados, transformados em estatísticas que, por sua vez, são compartilhadas com os órgãos públicos”, explica.
O professor de Gestão da Tecnologia da Informação (GTI) da Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina (FACAPE), Sergio Bento, avalia que, embora haja o uso de sistemas de geolocalização por parte de alguns governos estaduais, “a sociedade não estaria aberta a informar quem estaria com o vírus. Se eu te falar que o seu vizinho está com o coronavírus você mudaria a forma de tratá-lo. É mais importante o governo divulgar quantos teste já foram feitos”.
Privacidade
Luciano Melo ressalta que os dados obtidos pela empresa e enviados aos Órgãos Públicos são anonimizados, agregados e transformados em estatísticas “As autoridades terão acesso o percentual de pessoas que se deslocaram de seus bairros”. Para o professor Bento mesmo assim, há brechas que permitem conseguir informações. “A verdade é que existe muitas falhas de sistemas de segurança, bancos de dados. Muita gente tem acesso a essas informações”. Ele também pontua que as medidas mais eficientes para obter esses dados sem pôr em risco a privacidade seria limitar o acesso dessas informações. “ O acesso de sistema não autorizado possibilita utilizar informações com a desculpa de pandemia para ter acesso a dados que não deveria ter. Por isso, pouca gente deve ter acesso a isso”. Em relação a isso, o cientista de dados garante que a empresa adota medidas concretas de proteção da privacidade dos indivíduos. “ Nosso modelo de negócio, respeita a Constituição Federal, o Marco Civil da Internet, o Código de Defesa do Consumidor, o Código Civil e até mesmo a Lei Geral de Proteção de Dados que entrará em vigor em agosto de 2020. Após a pandemia esses dados serão deletados”, esclarece Luciano Melo.
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Fonte: In Loco - Mapa de Isolamento Social/ Covid-19
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De acordo com a legislação, os dados anonimizados e agregados não identificam nenhum individuo, por isso podem ser usados. A lei pontua em seu artigo 7 algumas exceções que permitem o uso de dados em casos de emergência, como, por exemplo, no tratamento e uso compartilhado de dados necessários à execução de políticas públicas previstas em leis e regulamentos ou respaldadas em contratos; para a proteção da vida ou da incolumidade física do titular ou de terceiro - como o que está acontecendo; para a tutela da saúde, exclusivamente, em procedimento realizado por profissionais de saúde, serviços de saúde ou autoridade sanitária. Mesmo nesses casos os dados devem ser usados somente para a finalidade de monitorar situações de emergência, mantidos de forma segura, não podendo ser vendidos ou compartilhados com terceiros, e devem ser apagados depois de superada a emergência, dentre outras proteções.
Reportagem: Emanuela Varjão, estudante de Jornalismo em Multimeios e colaboradora do MultiCiência.
Imagens: Foto1: Fonte Freepik
Foto 2: Fonte: In Loco - Mapa de Isolamento Social/ Covid-19
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