Em 31 de dezembro de 2019, foi
descoberto na China um novo tipo de vírus (coronavírus) que ainda não havia
sido detectado em seres humanos. Não demorou muito para o novo vírus, nomeado
como SARS-CoV-2, se espalhasse pelo mundo, dando início a uma nova pandemia, que trouxe impactos na na economia, cultura com interrupção de apresentação de atividades artísticas, transportes,
entre outros.
A educação inclusive foi uma das que mais foram atingidas. No Brasil, as escolas suspenderam as atividades presencias em
março de 2020, e passaram mais de um ano sem retornarem às aulas na modalidade
presencial/modo hibrido.
O ensino remoto foi a única forma para que, mesmo à distância, as aulas pudessem acontecer, mas, muitos alunos não tinham os aparelhos eletrônicos adequados para assistirem às aulas, e acabavam desistindo da escola ou até mesmo por ter que ajudar na sustentação da família. Assim que houve o retorno das instituições, alguns estudantes não voltaram a frequentar as escolas, por estarem envolvidas em outras atividades. Segundo a pesquisa do Unicef, 48% das crianças afirmam ter deixado a escola “por terem que trabalhar fora” e 30% afirmam ter saído “por não conseguirem acompanhar as explicações ou atividades” e isso, acabou gerando várias irregularidades na Educação Brasileira.
Para falar um pouco mais sobre essa temática importante, entrevistemos a professora do curso de pedagogia e do Programa de Pós-Graduação em Educação, Cultura e Territórios Semiáridos (PPGESA), da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Edilane Teles, desenvolve pesquisas sobre educação e comunicação. No artigo “O ensino remoto e os impactos nas aprendizagens” , a professora e as pesquisadoras Adriana Maria, Fabiana Nascimento e Suéller Costa expõem às dificuldades e os desafios da adaptação ao ensino remoto.
Confira a entrevista realizada por Alexandre José e Ana Clara, na qual Edilane Teles discute sobre superar as dificuldades de aprendizagem das crianças e
adolescentes.
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Ana Clara entrevistando a professora Edilane Teles sobre impactos da Covid-19 |
MULTICIÊNCIA: Analisando sua pesquisa,
como a senhora acha que a pandemia impactou na vida dos estudantes, e na
educação geral do país?
Edilane Teles: A pandemia impactou de uma forma que
foi quase um desastre. Estávamos passando por um processo de “sucateamento” da
educação, nos últimos anos houve poucos investimentos. Além disso, os
professores e a educação não estavam preparados para um modo de ensino
utilizando as tecnologias. Por mais que existissem pesquisas voltadas para o
uso das tecnologias e mídias no contexto educacional, isso pegou muita gente de
surpresa, em especial os professores que tiveram dificuldade para se adaptar ao
modo remoto.
MULTICIÊNCIA: Com muitas famílias
atingidas na pandemia, tendo que ficar em casa, o que a senhora acha sobre as
mudanças na rotina familiar de professores e alunos?
Edilane Teles: Penso que os pais foram obrigados a
ser verem presentes na vida dos seus filhos. Isso facilitou e ajudou. Mas,
muitas crianças não tiveram esse acompanhamento, por isso é necessário investir
nesses acompanhamentos de pais/responsáveis com os alunos.
MULTICIÊNCIA: A pandemia resultou
dificuldades a serem impostas não só para os alunos, como para coordenadores e
professores. Pela falta de aparelhos eletrônicos para se assistir e dar estás
aulas como a senhora acha que o poder público e os gestores municipais,
deveriam ter contribuído melhor com esses recursos?
Edilane Teles: Eles deveriam ter investido em
computadores para às crianças, pois houve um investimento no nosso país para
diversas questões, entretanto não fizeram esse investimento que era possível de
se fazer pela educação no país, havendo uma falta de assistência pelo poder
público.
MULTICIÊNCIA: Segundo levantamento do
Cetic.br, 80% dos professores, de ensino fundamental e médio da rede pública
(municipal, estadual e federal) relatam dificuldades para se adaptar ao ensino
remoto. A senhora acha que deveria ter algum tipo de curso para preparar melhor
os professores para o ensino online?
Edilane Teles: Sim, primeiro deveria ter se dado
uma melhor assistência a esses profissionais. O grupo de pesquisa do qual faço
parte no meu doutorado “Mediações EduComunicativas” da Universidade de São
Paulo, fizemos pesquisa com professores do Nordeste, colhendo 109 respostas.
Observamos, que muitos desses professores não tiveram assistência financeira,
tendo que assumir responsabilidades com seu material (chips, computadores,
celulares). Assim, os próprios professores financiaram a educação no período
remoto. E onde estão às instituições? Elas que deveriam garantir isso.
MULTICIÊNCIA: Mesmo com o decorrer da
pandemia e tudo sendo flexibilizado, as escolas foram os últimos espaços
públicos a serem abertos. A senhora acha que houve um descaso por parte do
governo por não priorizar também a educação?
Edilane Teles: Claro, seria a primeira a ser
priorizada, porque estamos falando de uma parte considerável da população
brasileira, a maioria.
MULTICIÊNCIA: Com a volta do
presencial a senhora acha que qual será o maior desafio a ser enfrentado?
Edilane Teles: Superar as dificuldades de aprendizagem,
em especial das crianças e adolescentes, porque eles até então, precisam fazer
construções que não foram realizadas antes, especialmente as crianças que não
aprenderam a ler. Uma pesquisa foi feita e praticamente mais da metade das
crianças brasileiras que estavam no período de aprender a ler e escrever não
aprenderam e, é preciso construir isso. Então, aqueles que possuíram
acompanhamento em casa, tiveram essa possibilidade de aprender, mas, muitos não
tiveram a mesma chance. A gente está encontrando nas escolas onde fazemos os
projetos de educom, crianças que pedem para ensinarmos a elas a ler e escrever,
e isso é muito grave. Uma criança do primeiro ano até o quinto ano precisa ter
conhecimento destas coisas básicas.
MULTICIÊNCIA: Mesmo com todas às
dificuldades, o ensino remoto e a tecnologia foram essenciais, até onde a
tecnologia foi um desafio no tempo remoto?
Edilane Teles: Aprender a utilizar, mas foi ao
mesmo tempo prazeroso. Porque a gente aprendeu, e olha que eu sou pesquisadora
da área da tecnologia a muito tempo. O fato de usar o tempo inteiro fez com que
se apropriássemos de coisas que não sabíamos, eu mesma sou uma delas. Agora,
tenho um canal no youtube, mas eu precisei de alguém para me ensinar a fazer o
canal e a usar o StreamYard para fazer as lives, inclusive na pesquisa que
fizemos com professores espalhados pelo Brasil, os mesmos dizem que a
aprendizagem dos aparelhos tecnológicos é um aspecto positivo, praticamente 70%
dos educadores afirmam ter aprendido.
Entrevista Ping-pong produzida por Alexandre José e Ana Clara para Agência Multiciência.
Fotos: Alexandre José.