Com uma atuação que vai da produção acadêmica à extensão universitária, o Observatório das Políticas Afirmativas Raciais (Opará) tem se consolidado como um espaço de articulação de saberes e práticas comprometidas com a transformação da realidade, militância social e grupo de pesquisa no território do Sertão do São Francisco. Vinculado a Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), no campus de Petrolina (PE), a organização está prestes a realizar o I Simpósio sobre Questão Racial — que acontece nos dias 13, 14 e 15 de maio de 2025, no Cineteatro da UNIVASF, no município pernambucano.
Para trazer mais detalhes sobre a construção deste Simpósio e ações afirmativas da Lei 12.990/2014 na promoção da equidade racial, nós conversamos com uma das coordenadoras do Opará, Ana Luisa de Oliveira, que também contou a trajetória do Observatório e importância de pensar a comunicação e educação a partir do território, da ancestralidade e da luta antirracista.
Ana Luisa de Oliveira. Foto: ASCOM Opará |
MultiCiência: Como surgiu o Observatório Opará e quais são seus principais objetivos?
Ana Luisa de Oliveira: O Observatório Opará surgiu a partir das inquietações do professor Edmilson Santos, que pesquisava ações afirmativas e políticas públicas, e durante o ano de 2019, escreveu o documento “Semeadura de um Baobá”, refletindo sobre seu legado e a falta de aplicação da Lei 12.990/14 - que trata da reserva de vagas para pessoas negras em concursos públicos. Na sua atuação junto ao Colegiado de Educação Física da UNIVASF-PE, ele impulsionou a criação de uma comissão antirracista e um relatório que revelou a omissão da universidade na aplicação dessa lei. A partir disso, consolidou-se a necessidade de um espaço de monitoramento e reflexão crítica, dando origem ao observatório. Com o tempo, a gente passou a atuar também em projetos de extensão e em ações mais diretas para com a comunidade. Hoje, o Opará é esse espaço múltiplo que mistura pesquisa, vivência e militância.
MultiCiência: Como nasceu a iniciativa de organizar o I Simpósio sobre Questão Racial?
Ana Luisa de Oliveira: A ideia do evento surgiu da urgência de criar um espaço dentro da universidade para discutir o racismo estrutural e promover o encontro de diferentes saberes em torno das questões raciais. Não queremos que seja só um evento acadêmico, mas um espaço vivo, onde a escuta, o diálogo e a presença dos territórios estejam no centro. Estamos preparando uma programação com mesas, oficinas, rodas de conversa e intervenções culturais. Vai ser um momento importante para reunir estudantes, pesquisadores, militantes e a comunidade do entorno.
MultiCiência: Quais os temas centrais do simpósio?
Ana Luisa de Oliveira: Vamos tratar de comunicacao antirracista, juventude, politicas públicas, memória e identidade. A proposta é tensionar os saberes acadêmicos com os saberes de quem vive essas experiências no cotidiano. Queremos fazer um evento que tenha sentido real para quem participa.
MultiCiência: E qual a importância de ações como essa dentro de uma universidade pública neste território?
Ana Luisa de Oliveira: Trabalhar a pauta antirracista no interior do Nordeste exige uma escuta muito atenta ao território e às experiências locais. Um dos maiores desafios é romper com a ideia de que o racismo é um problema ‘das grandes cidades’ ou ‘do Sul e Sudeste’. Muitas vezes, aqui, o racismo se expressa de forma mais sutil, mas profundamente enraizada nas práticas institucionais, nas relações de poder e no silenciamento da população negra.
Outro desafio é garantir que as ações do Observatório dialoguem com a realidade das comunidades e não apenas com o universo acadêmico. Por isso, a gente aposta muito na extensão, na escuta ativa e no trabalho com movimentos sociais. É nesse chão que a luta antirracista se fortalece e ganha sentido.
MultiCiência: E quais os resultados vocês esperam alcançar com a realização do I Simpósio sobre Questão Racial?
Ana Luisa de Oliveira: O nosso sonho é que o Opará continue sendo esse espaço de formação crítica e de articulação entre universidade e comunidade. Queremos fortalecer ainda mais a presença de mulheres negras, indígenas e pessoas periféricas nas discussões acadêmicas e políticas. Com o simpósio, a gente espera abrir caminhos para que mais pessoas negras ocupem espaços de fala, de poder e de criação dentro da universidade. Eu mesma espero olhar para o auditório e ver muitas pessoas negras — estudantes, professores, lideranças comunitárias — protagonizando os debates, apresentando seus trabalhos, sendo ouvidas.
E com muita coragem e compromisso, estamos construindo este evento de forma totalmente gratuita para quem vem assistir. Estamos trazendo lideranças políticas e intelectuais de várias instituições como AGU, MPF, DPU, TCU, MNU, etc… que, pela primeira vez, participam de uma iniciativa como essa no Sertão do São Francisco. É um marco para a região e um passo importante na construção de espaços verdadeiramente plurais e antirracistas.
Os interessados podem saber mais informações através das redes sociais do Opará no instagram (@observatorioopara) e do site: observatorioopara.com.br .
Por Inês Eugênia Cruz, estudante de Jornalismo em Multimeios, colaboradora do MultiCiência e vinculada ao Observatório Opará.