Filho de mãe empregada doméstica e pai agricultor de toda sua
família, tanto materna quanto paterna, Genderson Kaio Costa de Souza foi o
primeiro a ingressar no ensino superior. Inserido em uma realidade
preconceituosa e interessado por política, decidiu focar na área do combate ao
racismo. “Era tratado diferente em relação ao meu irmão mais novo que é branco.
Familiares diziam: bem que você poderia ter um cabelo igual ao do seu irmão -
cabelo liso - Colegas da escola falaram que eu poderia esclarecer minha pele
com tal coisa ou poderia alisar meu cabelo que ficaria bonito, não seja mais
pixaim.”
Gender, de 24 anos, nasceu na cidade de Mossoró duzentos e
oitenta e seis quilômetros da capital do Rio Grande do Norte, Natal. Residente
do bairro Dom Jaime Câmara, conhecido em Mossoró como Malvinas, em sua infância
já demonstrava interesse por política, pois em seu bairro existia o Grupo
Mulheres em Ação (GMA), que assistiu sua família. “Participava das aulas de
percussão, flauta doce, teatro e do Grupo Ousadia Juvenil, e tinha discussões voltadas
para o combate a violência contra a criança e adolescente, combate ao racismo e
ao machismo. Acredito que nesse espaço construído no bairro fez com que eu
tivesse mais interesse pela luta política”.
Suas vivências o levaram ao movimento estudantil/ juvenil.
Gender começou a compreender o racismo estrutural e percebeu que ele passava
por situações que as pessoas brancas ao seu redor não passavam. No ensino
médio, foi se apropriando do assunto e em 2016 participou de uma ocupação na
reitoria da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) em prol da
regularização dos pagamentos de bolsas permanência que estavam três meses
atrasadas, além de outras demandas envolvendo questões estruturais da
universidade.
- A entrada de estudantes negros e negras nas universidades é bem recente. Isso faz com que nossas demandas sejam colocadas em debate, mas, além disso, faz com que a gente, enquanto sujeitos negros queiramos incidir de alguma forma, pois historicamente o Movimento Estudantil foi um espaço ocupado por pessoas brancas e de classe média. Particularmente, consegui participar mais do Movimento estudantil porque durante toda a graduação tive acesso a um auxílio permanência estudantil.
Formado em Serviço Social pela UERN, Gender está concluindo
sua gestão na UNE 2019/2021, na qual ocupa a função de Diretor de Combate ao
Racismo e atua no Movimento Kizomba, organização presente em diversas frentes como Movimento
Estudantil, Movimento Popular, Economia Solidária, Feminismo, combate a
Lgbtfobia entre outras.
Gender buscou em sua gestão discutir e construir o debate
antirracista para dentro e fora da entidade a partir da construção de espaços
de organização dos negros e negras e recentemente, nos dias 11 e 12 de Junho de
2021, realizou o 7º encontro de estudantes negros e negras - ENUNE - que contou
com a participação de mais de 1.5 mil pessoas de forma virtual. Ele também organizou
o movimento "Future-se", para aprovar o adiamento da data de
realização do ENEM no contexto da pandemia.
- Neste ano, diante da pandemia, com os constantes ataques
não somente à educação, mas também à saúde e à vida do povo brasileiro, a
construção de atos de rua é essencial
para frear um pouco os desmanches, mas ainda não é suficiente para parar todos
ataques que estamos vivendo. O projeto do Governo Bolsonaro é um projeto de
subserviência ao grande capital e destruição da soberania nacional, nenhum
compromisso com o povo.”
Passar confiança em momentos de crise é um desafio para a
liderança jovem, mesmo como todos os movimentos, e constituindo uma quantidade
significativa da população, o jovem ainda é silenciado na sociedade.
- É um desafio ser uma
liderança jovem, pois há sempre quem queria deslegitimar por eu ser jovem. Mas
é muito importante ocupar espaços de liderança e construção. Isso faz com que a
gente aprenda muito. Ser uma liderança jovem é importante para que outros
jovens também tenham interesse em construir o espaço da luta política, que
visualizem nesse espaço uma oportunidade de mudar algo para melhor na sua vida
e de outras pessoas.”
É importante a existência de jovens como Gender, para mostrar
que podemos ter esperança em mudanças significativas no âmbito social mundial e
que ele inspire mais pessoas.
- Não esqueçam que nossa dor é coletiva, assim como nossa
vitória será coletiva. Ergam suas vozes e não deixem nos silenciar mais uma
vez. Organizem-se em algum coletivo que tenha como central o debate
antirracista. É muito importante compreender que só a luta coletiva muda a vida
das pessoas.
Reportagem de Aléxia Viana para Agência Multiciência.