Produção Cultural no Vale do São Francisco busca acolher Jovens LGBTQIAPN+

Multiciência 16 dezembro 2023
Visibilidade, vulnerabilidade e representatividade. Esses termos estão, cada vez mais, presentes na comunidade LGBTQIAPN+, buscando a valorização de identidade e a segurança dos direitos do público. Jovens LGBTQIAPN+ e aliados à causa buscam realizar o acolhimento dessas pessoas em situação de vulnerabilidade, utilizando do segmento cultural através da produção de eventos que tragam representatividade e proteção, principalmente combatendo a violência física.

De acordo com a Associação Internacional de Gays e Lésbicas (ILGA), o Brasil é o segundo país do mundo com mais direitos LGBTQIAPN+. Porém, é líder em taxa de mortalidade de pessoas LGBTQIAPN+, sendo o Nordeste a região com maior número de casos com 43,3%, segundo levantamento do Grupo Gay da Bahia, realizado em 2022 ao analisar notícias publicadas pelos meios de comunicação. A cultura do ódio é preocupante em diversos níveis. Conforme o relatório, a comunidade precisa ser abraçada para se sentir visível e pertencente à sociedade.

O produtor cultural Pedro Lacerda se entende como uma pessoa não-binária e queer. Formado em Artes Visuais pela Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) e desde 2013 atua na área de cultura no Sesc-Petrolina. O início na produção cultural foi incentivado e influenciado pelo cotidiano vivido dentro da instituição com a interação e trabalhos realizados junto aos artistas e profissionais de fotografia, até assumir a posição de coordenação de produção em alguns eventos.

Pedro Lacerda, produtor cultural.



No Vale do São Francisco, a produção cultural é um mercado que se popularizou recentemente com uma estruturação precária e influenciado pelas leis de incentivo emergencial - surgidas no período de pandemia do Covid-19 -, como os Editais disponibilizados pelo governo. Essa atitude facilitou o processo de produção e muitas pessoas se viram pertencentes a esse local de produzir, trazendo à tona o sentimento de visibilidade e representatividade. O Sesc tem muita importância neste tópico, pois é um espaço voltado à cultura, arte, produção e educação. A instituição “tem seu local de abraçar e as pessoas se sentirem confortáveis e em segurança naquele local. É um local de transformação!”, afirmou Pedro.

Em questão de produção e promoção de eventos que acolham esse público, Pedro ressalta que é feita, principalmente, por meio das redes sociais, mas que também os meios de comunicação tradicionais, como TV e Rádio, são bastante acessíveis na divulgação. Porém, feito de forma online traz mais segurança ao tentar alcançar todo tipo de público, sendo uma ação que auxilia na visibilidade e inclusão da comunidade na sociedade.

Pedro Lacerda explica que a produção cultural e a arte têm um poder transformador, ao mostrar para os jovens que é possível ser vulnerável e alcançar a visibilidade e poder representar, mas também, sentir a representatividade. “A minha imagem, a minha escrevivência e meu caminhar no mundo alcança o outro e o seu desejo pela liberdade de ser.”, afirma.

Produção Cultural na Região Norte
 
Em Rondônia, Rafaela Correia iniciou na produção cultural com a criação de uma festa, P.tzao. Porém, ela ainda não se entendia como produtora, por não ter se profissionalizado na área, estava se aventurando. “A proposta inicial da P.tzao era ser uma festa acessível, open bar, para a galera jovem que sentia falta de mais espaços para festejar”, explica Rafaela.

Rafaela Correia, produtora cultural.



A produtora relatou que a maior dificuldade ao iniciar o projeto foi a falta de conhecimento sobre produção na cidade, além da falta de apoio de outras organizações que realizam o trabalho no ramo, principalmente voltadas à comunidade LGBTQIAPN+. A receptividade do público fez com que ela não desistisse. 

Inicialmente, em 2017, a média de público do evento era de 400 pessoas e cada vez crescia mais. “Eu caí de paraquedas e as pessoas me apoiaram”, ressaltou. Rafaela explica que por ser um empreendimento independente, o desafio é a movimentação da renda, pois além da produção, existe a contratação de diversos serviços para a realização da festa, como a distribuição de bebidas.

Ao falar da realização de eventos para a comunidade, Rafaela relata que, na cidade,a produção está se fortalecendo, porém o acesso e o fomento é dificultado, afetando a demanda. Porém, o alcance é impulsionado com a divulgação pelas redes sociais.

Em questão dos Editais promovidos pelas Secretarias de Cultura, ela conta que sua experiência se iniciou pouco antes da pandemia de Covid-19, participando e propondo projetos. Da mesma forma que Pedro Lacerda, a produtora explica que as leis emergenciais incentivaram muitas pessoas e facilitaram o acesso à área. Rafaela explica que as políticas de fomento não são totalmente acessíveis, sendo assim, a comunidade ainda não compreende muito bem o processo burocrático, fazendo com que continuem produzindo de forma independente ou com patrocínio privado.

Rafaela Correia acredita que ações culturais voltadas à comunidade LGBTQIAPN+ tem diversos impactos, atingindo tanto o público, quanto quem produz. “Um dos impactos é a representatividade nesses espaços, traz acolhimento e referências.”, afirma. Realizações como essa dão abertura para que a demanda de trabalho de produção tenha uma facilidade de ser cumprida. “Até mesmo uma pessoa de fora da comunidade ter acesso, é entender que já é uma forma de combater um preconceito estrutural inserido na sociedade”, finaliza.


Por Aylla Bomfim, estudante de Jornalismo em Multimeios.