Ingressar em uma universidade é um dos sonhos de muitas pessoas, que veem no estudo uma forma de ascensão profissional e social. Mas, quando não a preparação oferecida no ensino médio não contempla os assuntos dos vestibulares e do ENEM, e não há a possibilidade de ingressar num curso pré vestibular privado, o que fazer?
Foi pensando nessa população que foi criado em 2003, como fase 1 do programa Faz Universitário, e regulamentado oficialmente em 2020 como política pública, através do Decreto 20.004 de 21 de setembro, o Programa Universidade para Todos (UPT), que é coordenado pela Secretaria da Educação do Estado da Bahia (SEC-BA) e executado em parceria com as Universidades Estaduais da Bahia (UNEB, UEFS, UESB e UESC), e algumas federais (UFRB, UFSB E UFOB).
O UPT para estudantes e egressos
Matheus Wislard é estudante do Programa, na sede de Juazeiro, e acredita que o UPT é muito importante para o reforço na aprendizagem necessário para as provas. Ele, que conheceu o curso através de uma amiga que lhe recomendou, acredita que por mais que boa parte do estudo deva ser realizada de forma individual e em casa, a iniciativa é muito eficaz, o que, segundo ele, é refletido nos índices de aprovação, que são altos. O assistente de suporte pretende ingressar no curso de Direito na Uneb, e se sente preparado para enfrentar os obstáculos da graduação.
Para Roseane Santos, que atualmente é estudante de Jornalismo em Multimeios na Uneb e fez o UPT em 2020 na sede de Juazeiro, porque conheceu o curso por já estar no ambiente da Universidade como estagiária de nível médio, a participação foi crucial. Pois, a fez consolidar os aprendizados, principalmente na redação, e se dar bem no ENEM, mesmo que parte do curso tenha sido online, por causa da pandemia da Covid-19.
Ela considera que mesmo com a implantação em uma comunidade quilombola, a descentralização ainda é pouca, e precisa atingir mais comunidades, visto que há milhares de pessoas que necessitam desse conhecimento, como foi com ela. “Precisa de mais professores, mais espaços e transportes, porque muitas pessoas querem entrar na universidade, e precisam só de um curso como esse para serem impulsionadas”.
A graduanda em Jornalismo em Multimeios e moradora da comunidade quilombola do Rodeadouro, Laila Michele Silva, conheceu o UPT por meio de amigos. Entrou no Programa no ano de 2020, ficando até 2021 em meio à pandemia de Covid-19, quando havia acabado de ter sua filha, o que pra ela foi melhor porque foi possível participar de forma online e concluir o curso, conseguindo entrar na Uneb em 2022, e começar a realizar seu sonho de ser jornalista.
“Não foi nada fácil conciliar as tarefas de casa com as demandas do curso, mas com a ajuda de todos que estavam ao meu redor, professores e colegas de turma, eu consegui”, destaca Laila Silva, que está no sexto período da graduação atualmente.
Sobre o Programa
O UPT, ou a UPT, como é carinhosamente chamado, é um curso pré-vestibular oferecido gratuitamente para estudantes e ex-alunos(as) das redes públicas estadual e municipal - de todas as séries - de Educação da Bahia. São oferecidas aulas no período noturno, de todas as áreas do conhecimento que são cobradas nas provas de ingresso ao ensino superior: Linguagens, Ciências Humanas, Ciências da Natureza e Matemática, as quais tem o principal objetivo de fortalecer os aprendizados e a preparação dos estudantes para conquistarem a tão sonhada entrada na graduação.
As aulas são ministradas por estudantes das próprias universidades que aderem ao UPT (UNEB, UEFS, UESB e UESC), e por professores da rede municipal e estadual, e funcionam de segunda a sexta nos pólos, que podem ser em escolas e nos campi das universidades, nas respectivas cidades baianas. Na Uneb, são 27 pólos, que estão localizados nos municípios - e zonas rurais - onde há campi, distribuídas por territórios de identidade do Estado. Juazeiro, situada no extremo norte da Bahia, é uma dessas cidades onde o programa funciona.
Extensão dos polos: chegada às comunidades fora das cidades
Juazeiro é uma cidade, que como várias da Bahia, possui uma população que mora em comunidades quilombolas, que mantém as heranças ancestrais africanas em seu cotidiano; ao todo são 14 localidades, de acordo com o levantamento do Ministério do Desenvolvimento: Alagadiço, Aldeia, Angico, Barrinha do Cambão, Barrinha da Conceição, Capim de Raiz, Curral Novo, Deus Dará, Junco, Pau Preto, Juazeiro Passagem, Rodeadouro, Salitre e Quipá. Por isso, há uma quantidade considerável de pessoas que moram nessas comunidades e a presença do UPT se faz mais do que necessária, devido à distância para a Uneb e aos custos que esse deslocamento provoca.
Pensando nisso e em tantas outras comunidades que ficam fora dos centros urbanos, o UPT vem sendo implantado em diversos espaços, como zonas rurais, comunidades de pescadores e marisqueiros, comunidades quilombolas, aldeias indígenas, Terreiros, associações LGBT, dentre outras. Além disso, busca-se a abrangência ainda maior do Programa e a democratização do acesso à universidade, representando avanços significativos e fazendo com que diversas pessoas possam ocupar as vagas ofertadas na graduação.
Em Juazeiro, atualmente há 135 alunos matriculados no polo da zona urbana, que funciona no campus da UNEB (95 alunos), na comunidade Quilombola do Rodeadouro (15 alunos) e em Sento Sé (35 alunos), cidade vizinha, que fica à 192 km de distância.
A horizontalidade do UPT: de estudante para estudante
O quadro de monitores do Programa UPT é composto, em sua maioria, por estudantes de graduação, que, ao atenderem os requisitos e se interessarem por ministrarem as aulas, passam por um processo seletivo que inclui a realização de uma aula expositiva. Ao ingressarem são remunerados por aula e constituem o formato que talvez seja um dos grandes diferenciais do programa: ter estudantes dando aula para outros estudantes, de níveis diferentes, mas sendo estudantes.
Segundo a coordenação geral do UPT, essa forma de desenvolvimento é importante porque agrega a quem aprende e a quem ensina, servindo como uma forma de iniciação à docência, não somente para os que fazem licenciaturas, mas para todos(as), e algo que pode despertar no(a) graduando(a) habilidades que nem sabia que possuía, representando benefícios para a vida profissional e acadêmica. Irina Bernardes resolveu ser monitora do Programa em 2022, repetindo o feito no ano seguinte, por entender que vindo de uma escola privada e, atualmente, estudando na Uneb - curso de Jornalismo em Multimeios -, há a necessidade de devolver para a sociedade o que recebeu da universidade durante seu curso de graduação.
“Sempre me interessei por projetos que dialogassem com a comunidade externa. Eu quis buscar devolver o investimento público em mim, que vim de uma escola privada, e pra mim o UPT fez total sentido. Também queria me desenvolver mais, em termos de oratória, didática”, explica.
Atualmente no 9º período, quase concluindo a graduação, Irina entende que sua passagem pelo curso a proporcionou desenvolver um trabalho com muito propósito e fazer parte da vida de várias pessoas. “Aprendi que o mais importante em uma sala de aula não é ter o melhor planejamento, mas é ouvir os alunos”.
O UPT para a coordenação de Juazeiro
De acordo com José Augusto Gonçalves, atual coordenador do UPT no pólo de Juazeiro, o Programa é uma ação de muita relevância local. “O UPT é fundamental para promover inclusão educacional e social, especialmente estudantes de escolas públicas e comunidades tradicionais. Abre portas para o ensino superior, oferecendo a estudantes que muitas vezes não teriam acesso a essas oportunidades, uma chance de transformar suas realidades”, pontua.
O servidor público enxerga no UPT diversos benefícios. “Para a sociedade baiana, o programa contribui para a redução das desigualdades educacionais, aumentando o número de jovens ingressando na universidade e, consequentemente, impactando a qualificação profissional e o desenvolvimento socioeconômico do estado”, conclui.
Evento Diálogos Pedagógicos UPT Uneb
Na última semana, entre os dias 21 e 23, aconteceu na Uneb de Juazeiro, o evento anual “Diálogos Pedagógicos UPT na Uneb - Nas águas do Velho Chico: (entre) sonhos e travessias”, que teve como objetivo socializar as experiências vividas por estudantes, egressos, monitores e por toda a comunidade acadêmica envolvida na realização do UPT, e pensar também em propostas a serem implementadas a fim de melhorar ainda mais o curso que é porta de entrada para a transformação de muitas vidas, não somente de Juazeiro e a região norte, mas de toda a Bahia.
Foram três dias vividos entre as margens e também sob o Rio São Francisco, e nos dois departamentos que formam o campus III, nos quais pessoas de diversos campi da Uneb, de outras UEBAs e das universidades federais estiveram presentes, e participaram de rodas de conversa, mesas institucionais, atrações musicais e culturais. Além disso, aconteceu também o plantio de uma árvore nativa e a distribuição de mudas para os participantes.
Continuidade do UPT
Embora as provas do ENEM 2024 já tenham acontecido, as aulas do UPT continuam em todos os pólos, pois em janeiro do ano que vem, 2025, nos dias 12 e 13, acontecerá o Vestibular da Uneb, prova cuja o curso também prepara os estudantes.
Serão dois dias nos quais os milhares de alunos espalhados pela Bahia poderão pôr em prática os conhecimentos adquiridos e aperfeiçoados no programa, nas provas das quatro áreas do conhecimento e na prova de redação e, assim, garantir suas vagas nas diversas instituições públicas de ensino baianas e brasileiras.
Os resultados das provas do ENEM serão divulgados em 13 de janeiro de 2025. E pelo que depender do empenho dos estudantes, há a certeza de que o UPT continuará a colher altos índices de aprovação.