Pagamento e recebimento de direitos autorais geram polêmica

. 05 junho 2009
A música é um bem, um produto, fruto da criação. Para proteger esse patrimônio cultural, os artistas se associam ao Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD), órgão responsável por fiscalizar a execução pública de músicas. No entanto, o modo de funcionamento desta instituição privada tem causado questionamento dos diversos segmentos da área musical devido à necessidade do pagamento de direito autoral.

Para executar música publicamente nos veículos de comunicação, é necessário solicitar autorização prévia ao ECAD. As taxas cobradas pelo órgão, que não deve ter finalidade de lucro de acordo com a Lei 9.610/98, são consideradas caras pelas rádios comerciais. Em média, são pagos de R$ 1600 a R$ 1850 em direitos autorais para executar músicas. Para o diretor da Tropical Sat, Flávio Ciro, o valor pode ser considerado elevado, já que veiculação da música também promove a divulgação do artista.

Os valores a serem pagos são definidos pelas associações de músicas que integram a instituição a partir do Regulamento de Arrecadação e Tabela de Preços. “Dos valores arrecadados, 75% são repassados aos titulares filiados, 7% são para as associações de músicas e os 18% restantes ficam com o ECAD para sua administração”, esclarece Gerson Santana, agente fiscal do ECAD que atua em 26 cidades, oito na Bahia e 18 em Pernambuco. Para um titular receber o pagamento do direito autoral é necessário, além de se filiar a uma das dez associações, informar o repertório de todas as suas músicas para que o ECAD capte, identifique e possa fazer a cobrança nos locais de veiculação pública de músicas tais como lojas comerciais, casas de show e emissoras de rádio e televisão.

As rádios comunitárias também não escapam do pagamento desses direitos. Em média, elas devem pagar por mês seis Unidades de Direito Autoral (UDAs), o que corresponde a R$ 255,06. A rádio Liberdade FM do Distrito de Campos de Juazeiro já recebeu vários boletos do ECAD, mas de acordo com o presidente da rádio, Marcelo Luiz da Silva, não há como pagar. “Já deve estar uma conta enorme. Estamos deixando a dívida rolar. A gente considera até injusto, pois a rádio atua sem fim lucrativo, deveríamos ser isentos dessa taxa”, defende.

Já o Sistema de Comunicação da Associação (SICA) do bairro Tabuleiro, em Juazeiro, até o momento não foi visitado pelo ECAD. O coordenador da rádio-poste – como é mais conhecida – Charles Alexandre, considera justa a cobrança dos direitos autorais. “Quem tem o trabalho de elaborar música tem que ter o seu reconhecimento”, afirma. Contudo, considera complicado para as rádios comunitárias efetuarem o pagamento, pois estas não dispõem de recursos financeiros, recebem apenas apoio cultural, previstos na Lei nº 9.612 que regulamenta a radiodifusão comunitária. Ele sugere que as rádios comunitárias e sistemas de alto-falantes tenham recursos municipais ou federais para que também possam contribuir com os compositores. “O que não pode acontecer é o próprio diretor tirar do seu bolso para pagar direitos autorais”, afirma.

O compositor Manuca Almeida considera a arrecadação no Brasil inoperante. “Se eu recebesse o que eu tinha de receber, se a lei fosse cumprida, eu teria uma condição de vida bem melhor,” diz. Ele é favorável a cobrança de direitos autorais às rádios comunitárias. “Se eu souber que uma rádio toca minhas músicas, de manhã, de tarde e de noite e eu não recebo nada, chega uma hora que eu não vou ter interesse nenhum que ela toque. A gente vive de música. O profissional precisa receber pelo que faz”, enfatiza.

Segundo o secretário da Associação Cultural e Artística de Radiodifusão Comunitária Sertaneja FM (ACARCOS) do distrito de Pinhões, Marcos Vinícius, já ocorreram casos de rádios que foram fechadas por não pagarem os direitos autorais. Ele afirma que é uma questão de interpretação da lei, já que determinado juiz pode dar prioridade à lei que regula os direitos autorais ou às rádios comunitárias.

Para o cantor e compositor, Targino Gondim, houve avanços no pagamento e recebimento de direitos autorais, embora ainda considere que seja precário no Brasil. “Os brasileiros não têm a cultura de saber e respeitar os direitos que os autores, compositores, intérpretes, músicos, artistas têm. Então, fica difícil de imprimir essa cultura na cabeça das pessoas, que isso é lei, que se você está usando a música de alguém, que foi interpretada ou tocada por alguém, aquilo ali, por direito, a gente tem que receber, tem que ter um retorno”. Para ele, as rádios comunitárias devem pagar direitos autorais, pois acredita que estas têm funcionado como empresas. “As rádios comunitárias não existem só para doar, elas existem para se dar bem também. Elas empregam, elas são empresas”, declara.

A polêmica está lançada: será necessário cobrar direito autoral às rádios comunitárias? A questão permanece com opiniões divergentes entre artistas e os associados das rádios. Até o momento, a lei ainda não é precisa quanto a essa necessidade. Para o Ministério das Comunicações, rádio comunitária não pode ter fins lucrativos nem vínculos com empresas, partidos políticos e instituições religiosas. A sua função é promover atividades educacionais e melhoria das condições de vida da população.


Por Naiara Soares, repórter
Emerson Rocha, fotógrafo