Na Marca da Cal

. 11 junho 2010
Quando o juiz da partida marcou aquele pênalti, sabia que era a chance de escrever o meu nome na história do clube. Eu era o craque do time, já tinha marcado 29 gols no campeonato, era artilheiro. Se fizesse aquele gol, aos 47 do segundo tempo, o nosso time conseguiria a vitória e o tão sonhado título. Ao me preparar para cobrança, pude ouvir cada um dos 60 mil torcedores que lotavam o nosso estádio. Um em especial, não saia da minha cabeça. Ele gritava mais que os outros. Embora as lágrimas começassem a lhe correr pelo rosto ele era o que mais confiava em mim, tinha plena certeza de que acertaria a cobrança e que seriamos campeões. Até hoje aquele rosto não me sai da cabeça... A cada passo em direção à bola e a cada grito da torcida, meu coração disparava. Mas por que estou nervoso? Até hoje nunca perdi um pênalti, sou o maior goleador do campeonato, a torcida me ama. Mas se o dia de perder for hoje, justamente hoje? Será que eles vão continuar me amando? E aquele torcedor, ele acredita em mim, não posso decepcioná-lo. Olho para a lateral do campo e vejo o meu treinador com os olhos fixos em mim. Fora ele quem me descobriu para o futebol, antes dele me conhecer eu era apenas um jogador da terceira divisão, ninguém sabia quem eu era, tinha o meu valor, mas ninguém sabia. Se perder esse pênalti, tiro a chance do nosso treinador conquistar o seu primeiro título, não vou decepcionar quem tanto me ajudou. Agora estou a quase três metros da marca da cal, o coração continua a mil, a torcida grita ainda mais, alguns já começavam a soltar o grito: é campeão! Eles tinham razão para isso, quem partia para cobrança era o seu melhor jogador. A animação era tamanha que ninguém no estádio percebeu o meu nervosismo. Chego mais perto da bola, enfim olho para o goleiro adversário, os seus olhos intimidam. Não lembrava dele ser tão alto! Ele costuma pegar pênaltis, é um bom goleiro, já esteve na Seleção. Calculo a melhor forma de fazer a cobrança. Posso mandar uma bola colocada no canto, mas ele é muito alto, vai que pega? Talvez eu bata forte no meio do gol, mas se for muito forte e a bola subir demais? Tenho que vencer esse monstro que está em minha frente, mas como? Esses são os segundos mais longos da minha vida. Ainda não sei como fazer a cobrança, a torcida parece cantar cada vez mais alto, o goleiro continua crescendo, o treinador com o olhar ainda mais atento, o país inteiro está me vendo agora. Não devia ter vindo fazer essa cobrança, poderia ter deixado outro jogador, o nosso time é bom. Com certeza, apareceria outro batedor. Não posso perder! O árbitro autoriza a cobrança, agora é a hora! Dou 10 passos em direção à bola, para mim eles foram mais longos que uma maratona. De repente não ouço nem vejo mais nada, sumiu o treinador, o torcedor eufórico, o goleiro, todos, era apenas eu e a bola. Sinto os meus pés tocando-a de forma suave, e ela vai indo, indo, indo... Para aumentar a minha angústia a danada acertou a trave e, de forma caprichosa, correu a linha, entrando de forma sutil e delicada. É Gol! Por Emerson Rocha