“O homem que sabia javanês” denuncia a sociedade carioca

. 05 dezembro 2010


Publicado pela primeira vez em 1911, pela Gazeta da Tarde, o conto “O homem que saiba javanês” é uma demonstração clássica do talento de Lima Barreto como contista e observador atento dos costumes da época. Narrado em primeira pessoa por “Castelo”, que se utiliza de uma linguagem libertina ao contar sua história ao amigo “Castro”, reconstrói um ambiente descontraído, humorístico que denuncia a sociedade do Rio de Janeiro. Com o enredo se desenvolvendo em uma confeitaria do Rio de Janeiro, o protagonista é retratado como um “malandro” que deseja ascender rapidamente por meio do famoso “jeitinho brasileiro”.

Para apresentar a obra, a Agência MultiCiência entrevistou o professor Vlader Nobre Leite, graduado em Direito e em Letras, e mestre em Literatura pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Vlader trabalha no colégio Dom Bosco, no GEO de Juazeiro-BA e de Petrolina-PE, e nos cursinhos pré- vestibular Decisão, Elite e Objetivo.

“Eu diria que sou escravo da minha vocação”, declara Vlader sobre a sua escolha pela profissão. Para ele, a atividade de docência é a mais política de todas, pois diariamente é possível transformar a realidade, mesmo com alguns problemas como ocorrem em outras profissões. “Sempre me achei capaz de ministrar aulas, promover reflexão critica na juventude. Quem ama o que faz não sofre com o que faz”, afirma o professor. Em entrevista, Vlader explica e sintetiza a Obra “O homem que sabia javanês” do autor Lima Barreto, indicada para o vestibular 2011, da Universidade do Estado da Bahia (UNEB).

O autor Afonso Henriques de Lima Barreto se utiliza de ironia e sarcasmo em suas publicações, tecendo forte criticas a sociedade brasileira de sua época. “As características marcantes apresentadas em suas obras são: cenas que demonstram o cotidiano suburbano, a pobreza e o preconceito racial. Torna-se o precursor do romance dos anos 30, explica o professor.

O professor Vlader sintetiza a obra para melhor compreensão dos leitores: "O homem que sabia javanês" fala da trajetória de um cônsul que chegou à posição fazendo crer a todos que sabia falar javanês. Mais que isso, logrou ser tomado como um expert na literatura de Java e por conta desse inusitado conhecimento ascende socialmente de forma meteórica. O autor optou pelo formato do "diálogo", embora, como no primeiro caso, a narrativa lembre mais um monólogo, visto que as interferências do interlocutor são mínimas e sobretudo com a função de dar continuidade ao discurso do narrador. Em uma situação financeira difícil, o narrador-personagem se decide, por desespero de causa, a se passar por professor de javanês e responde a um anúncio de jornal que procurava um profissional desse tipo. Embora nada soubesse da língua, aprendeu o alfabeto e algumas poucas palavras em javanês, o bastante para simular certo conhecimento e impressionar seu "aluno" que, como o leitor comprova mais tarde, desconhecia totalmente o idioma. Em um ambiente em que o javanês era absolutamente ignorado, seu estratagema não somente funciona como faz dele uma celebridade no assunto”.


Para o professor Vlader, “por meio da manipulação e de atitudes bem calculadas, Castelo, o pretenso professor de javanês, ganha respeitabilidade, reconhecimento público e atinge altos cargos com direito a regalias especiais, como viajar a Europa para representar o Brasil num congresso de Linguística. Ele, protagonista-narrador do conto, descreve seus truques de esperteza para manter o status que conquistou à custa de uma farsa, protegida pelo fato de possuir um conhecimento inacessível à maioria. Além disso, também investe em duplicar suas pretensas habilidades, tratando de promovê-las, como no episódio em que faz publicar e circular um artigo acerca de si próprio, durante sua estada na Europa”.

Neste conto, Lima critica a sociedade burguesa e a ausência do intelectual, mostrando que o reconhecimento social não depende da verdade, pois a ascensão social vem das relações de pessoas influentes, esclarece Vlader.


por Karine Nascimento (texto) e Lorena Santiago (foto)