Brincadeira todos os dias e na Semana Mundial do Brincar!

Multiciência 28 maio 2020




O texto hoje é uma homenagem e um convite, o primeiro, uma lembrança necessária de que esta semana (23 a 31 de maio) comemoramos mundialmente o ‘Brincar’ e assim reforçar o convite de que é preciso proporcionar às crianças tempo e espaço para esta ‘atividade’ tão necessária para seu desenvolvimento pleno. Para provocar nossas reflexões, iniciamos com uma história:
“Maria tinha acabado de fazer 4 anos e estava ansiosa por entrar na escola. Imaginava como seria maravilhoso tantos amigos para brincar e em lugar seguro! Afinal, sua mãe não permitia que brincasse com as crianças maiores. A rua da sua casa era movimentada, assim ela tinha que ficar dentro de casa. A primeira semana na escola foi cheia de novidades, começo do ano sempre tem palhaço, pipoca, histórias, pula-pula!
As semanas seguiram e Maria percebeu que a escola não era um lugar pra brincadeira. Às vezes, até podiam ir ao parque. Os 40 minutos mais esperados da semana! Mas este momento tinha que ser conquistado com muita disciplina, senão, só na próxima. Tinham crianças que não conseguiam ir ao parque nunca, todo mundo já sabia. Eram citados como exemplos. Ah! E o recreio? O recreio era feito para comer devagar, lavar as mãos, os dentes e voltar para sala. 
Mas, personagens de faz de conta não faltavam nessa escola e aos poucos Maria ia colocando cada um em algum lugar do seu imaginário. A merendeira às vezes carrancuda, o agente de portaria silencioso, a coordenadora séria, a diretora apressada e a professora exigente. Muitas vezes lápis e borrachas faziam com que Maria brincasse com sua imaginação.
Em casa, a televisão e o tablet tomavam conta da tarde de Maria, com desenhos e jogos, ela não sentia mais falta de certas brincadeiras. Só quando alguém começava a brincar...era irresistível! Um dia, a mãe de Maria perguntou se ela queria fazer massinha. Foi uma tarde tão maravilhosa....Maria e sua mãe não só fizeram a massinha de todas as cores mas modelaram, brincaram e continuaram juntas até Maria dormir.”                                      
A história de Maria surgiu de inúmeras observações realizadas no cotidiano da Educação Infantil de algumas escolas. Poderíamos falar de vários pontos destacados nestas poucas linhas, mas, como estamos na ‘Semana Mundial do Brincar’, resolvemos abordá-lo na coluna desta quinta. Propomos assim, questionar os limitados espaços-tempos e/ou ausência do brincar nas escolas e no cotidiano de muitas crianças, sua substituição pelos eletrônicos em casa, e a necessidade de criarmos condições para que as brincadeiras aconteçam e sejam estimuladas neste momento de distanciamento social.

Sabemos que as crianças brincam sem ou com objetos, colegas ou adultos. Criança brinca! O brincar está na sua imaginação e constituição como sujeito, nesse entendimento acreditamos (esperamos!) que não exista adulto que não lembre de suas brincadeiras ou do sentimento de satisfação, de tarefa sendo cumprida, de que o prazer de invenção e interação com as coisas acontecem. Parece óbvio que quanto mais pessoas estiverem na brincadeira, maior o número de possibilidades imaginativas e mais divertida ela será. Os elos afetivos se estreitam e a criatividade, por mais caminhos, jeitos, formatos, despertam.

Brincar independe de poder aquisitivo, língua, etnia; a brincadeira é democrática. Muitas vezes não importa a brincadeira em si, o importante é estar, pensar, criar e divertir-se juntos. Anna Freud afirmava que o brincar é o ‘trabalho das crianças’. Acrescentamos ainda, que é parte essencial da linguagem, o meio pelo qual aprendem a conhecer o mundo. Portanto, é graças a esta ação tão natural da infância, através da qual desenvolve sua inteligência, e também a usa para explorar as próprias emoções, demonstrar seus medos, conflitos, esperanças, preocupações, além de vínculo das relações que estabelecem com os outros.

Brincando a criança descobre o seu mundo, o que está em volta dele e ressignifica suas percepções reais. Através do brincar a criança expõe seus sentimentos e verbaliza suas questões, observações, dúvidas. Entretanto, para isso temos que ouví-la, estar junto participando desse momento tão ímpar e precioso.

                          
Foto: Acervo Pessoal
                                 
Temos visto ao longo do tempo que os brinquedos mais sofisticados tomaram conta do brincar das crianças. O helicóptero que faz barulho e rodopia, a boneca que parece um bebê de verdade, a espada que brilha e tantos outros lançamentos que estimulam os olhos e ouvidos das crianças e que em alguns momentos são trocados pela caixa de papelão ou pelo saco do embrulho. Muitas vezes a tentativa de estímulo está no poder de imaginar e não ao estímulo visual e auditivo que aquele objeto propõe. E, o que dizer dos jogos eletrônicos, que estimulam ‘continuamente’ e de forma ininterrupta outras áreas do brincar? Diversamente destes, o arrebatamento de crianças brincando de bolinha de gude, fazendo suas pipas, rodando seus piões ou empunhando o cabo de vassoura é mais reflexivo pelos movimentos e inter-relações “em real” que provocam.

Neste processo, estamos entre duas dimensões de interação; o brincar que estimula as múltiplas e secretas linguagens das crianças, dos recessos do coração às interações diversas com o(s) outro(s), e esta outra modalidade, digital e veloz que tem sempre uma ‘tela no meio’ mudando os modos de entendimento do brincar. Neste momento convidamos pais e responsáveis das crianças, que não saem de casa por conta do distanciamento social, a criar oportunidades para brincar além das telas.

Atenção aos excessos! Como provoca Levin (2007), estamos “Rumo a uma infância virtual?”. Se não oferecemos uma rotina e acompanhamento às crianças, deixando-as sempre diante das telas, os construtos, interações e comportamentos farão emergir questões a serem (re)pensadas como, por exemplo, crianças agitadas, ansiosas, impacientes com o passar do tempo, com dificuldades de ver além do quê os “brinquedos eletrônicos” mostram. É preciso diversificar as experiências para aprendizagens diversas, o que possibilita compreender melhor as questões da ‘vida. Como dizem os educadores e psicólogos “Brincar cura!”.

                                        Foto: Acervo Pessoal


Para provocar vossa imaginação, no quadro abaixo elencamos brincadeiras para estes dias dentro de casa. Podemos brincar de Faz de Conta e sermos o que quisermos, confeccionar a boneca Abayomi, colocar um lençol em cima da mesa para fazer uma cabana e ler algumas histórias de medo ou contos de fadas, preparar um piquenique em algum lugar legal da casa, brincar com jogos de tabuleiro entre outras tantas possibilidades que possam fortalecer os vínculos afetivos entre pais e filhos, cuidadores e crianças.

Vamos Brincar! Quente ou frio?

Lista de Brincadeiras:










Artigo produzido pelas responsáveis e organizadoras da Coluna Polifonia




Adriana Maria Santos de Almeida Campana
Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Educação, Cultura e Territórios da Universidade do Estado da Bahia (PPGESA/DCH III/UNEB. Membro do Grupo de Pesquisa em Educação Contextualizada, Cultura e Território - EDUCERE. Email:didacampana@yahoo.com.br.


Edilane Carvalho Teles
Doutora em Comunicação pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade de São Paulo (PPGCOM – USP); Docente da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Departamento de Ciências Humanas, Campus III. Vice-Líder do Grupo de Pesquisa em Educação Contextualizada, Cultura e Território - EDUCERE. E-mail: edilaneteles@hotmail.com

Ilustação: Melo, estudante de Jornalismo em Multimeios