É possível não misturar política e futebol?

MultiCiência 29 novembro 2022

Após reprovação à Neymar, torcedores questionam se as pessoas devem criticar o jogador na copa por causa do seu posicionamento nas eleições.

Com sede no Catar, a 22ª edição da Copa do Mundo atrai atenção de torcedores brasileiro e teve início apenas alguns dias de uma das eleições mais importantes da história brasileira, com a vitória do então eleito futuro presidente Lula (PT) sobre o atual presidente Jair Bolsonaro (PL). Depois do clima eleitoral, as emoções populares ainda estão afloradas e se refletem nas críticas sofridas por Neymar Jr., craque da seleção, em consequência do seu controverso posicionamento político.


Foto: Chung Sung / Getty Images


Conhecido como “país do futebol”, o Brasil carrega o maior número de vitórias no campeonato, cinco no total, e ainda é o único país participante de todas as copas do mundo na história. Não tem como falar de copa sem falar de Brasil e não tem como falar do Brasil sem falar de futebol. Com todas as suas contradições, o esporte está enraizado no cotidiano dos brasileiros, somos ensinados desde cedo que devemos amar o futebol, e, até os que não têm paixão pelo esporte, param para acompanhá-la. Assim, a copa se tornou o evento que une as pessoas, faz desconhecidos entoarem juntos o hino nacional e colorirem as ruas com o verde e amarelo; vizinhos pintam a bandeira nas calçadas; família e os amigos se reúnem na sala de casa para acompanhar juntos os jogos e se emocionam com os resultados da seleção.

No entanto, em decorrência desse período em que o Brasil vive em notória polarização, é difícil dizer que somos capazes de fazermos uma copa como antigamente. Enquanto a seleção se preparava para enfrentar o seu primeiro jogo contra a Sérvia, no último dia 24, no questionável Catar, no Brasil alguns manifestantes golpistas continuavam nas ruas contestando os resultados das eleições presidenciais. Além disso, com o discurso de “a nossa bandeira jamais será vermelha”, os bolsonaristas tomaram para si a camisa da seleção como símbolo e, apesar de todas as tentativas para desatrelar o manto brasileiro do falso patriotismo, ainda há uma ligação evidente e, por isso, um bloqueio de alguns brasileiros em usarem a camisa amarela. Como se não bastasse, alguns jogadores, dentre eles o mais aclamado mundo afora e igualmente polêmico, Neymar Jr., declararam voto ao atual presidente nas eleições.


Imagem: Reprodução/Instagram/Jair Bolsonaro


Neymar construiu uma carreira de excelência, com 30 anos de idade, coleciona inúmeras vitórias por todo o mundo e é considerado o melhor jogador do Brasil em atividade. Não à toa, o menino Ney – como costuma ser chamado por seus admiradores – já apareceu duas vezes como o 3º melhor jogador do planeta no ranking da FIFA. Revelado no Santos Futebol Clube e ovacionado pela sua “ousadia e alegria” no time brasileiro, Neymar joga atualmente no Paris Saint German, na França, após uma gloriosa passagem pelo Barcelona, na Espanha, com diversos títulos importantes e uma vida de astro.

Apesar do fim do Ministério do Esporte em 2019, dos cortes de mais de 36% de verba previstos no Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2023 para o seguimento, redução do Bolsa Atleta, os 700 mil mortos em decorrência da pandemia da Covid-19, mais de 33 milhões de famintos e diversos outros fatores que marcam o Governo Bolsonaro, Neymar fez questão de declarar seu voto e apoio ao atual presidente. Não suficiente, o menino da vila se engajou na campanha para reeleição de Bolsonaro e chegou a prometer que festejaria gols na copa com símbolos que representam os números do presidente. Assim, sendo a personalidade mais midiática da seleção, é justo dizer que Neymar carrega a culpa pela dificuldade ainda maior da despolitização e repulsa ao uniforme do Brasil.

Não é necessário ser um expert em futebol para afirmar que Neymar é um dos maiores jogadores da atualidade. Seu voto não atravessa seu desempenho maestral em campo, mas vale lembrar que eleição não é a única razão para o jogador carregar esse asco vindo dos torcedores, aliás, o menino Ney não gera antipatia somente de torcedores brasileiros. Comportamento egoísta ou agressivo com técnicos, árbitros, outros jogadores e até torcedores marcaram a sua carreira também. Sem falar todas as polêmicas fora de campo.

Com isso, entendo que entre ser ovacionado na copa, por causa do seu talento, apesar das eleições; ou ser criticado na copa, apesar do seu talento, por causa das eleições, a segunda opção me parece mais justa.  Se Neymar Jr. prefere homenagear Jair Bolsonaro após um gol durante um jogo na copa, é natural que parte dos torcedores prefira ver somente um jogador como Richarlison, defensor de pautas científicas, sociais e ambientais, brilhando em campo. É inegável a importância de Neymar para a seleção, porém é fundamental que o povo tenha memória, mesmo que isso incomode aos muitos que o amam.

Então, nada melhor para o Brasil que o menino Ney se recupere bem, volte a jogar o mais rápido possível, nos ajude a conquistar o hexa e continue sendo duramente criticado pelos seus posicionamentos irresponsáveis nas eleições.

 

Por Marcos Souza, estudante de Jornalismo e militante do MAB na Bahia.