Artigo da professora, pedagoga e Doutora em Comunicação (ECA/USP), Edilane Carvalho, professora Permanente do mestrado em Educação, Cultura e Território (PPGESA/UNEB, DCH III); e líder do Grupo de Pesquisa Polifonia - Observatório de Educação e Comunicação, e de Romário Djavan Lins de Araújo, graduando de Ciências Sociais (Universidade Federal do Vale do São Francisco - UNIVASF);
Essa breve reflexão visa promover a elaboração de um estudo necessário ao contexto acadêmico sobre o ChatGPT e os desafios que teremos à frente com essa inteligência artificial (AI). Para tanto, apresentaremos algumas perguntas, às quais ainda não temos respostas, mas que consideramos relevantes às investigações no âmbito das universidades e formações sobre mais um protótipo e tecnologia que nos desafia. Assim, questionamos:
• É possível afirmar que as produções criadas têm limites claros à formação e aprendizagens?
Ou ainda, "O que separa a nossa capacidade de elaboração e o ChatGPT"?
Para compreender melhor o que temos à frente, fizemos duas perguntas ao ChatGPT: a primeira sobre a metodologia dos projetos de intervenção social, e a segunda, sobre o conceito de educomunicação. As respostas que obtivemos foram, por assim dizer, coerentes e corretas, entretanto, vale salientar que isso não acontece com todas as demandas postas à AI, respostas equivocadas, erradas e superficiais também aparecem, a depender do tema e especificidade.
Ao nos depararmos com os avanços tecnológicos, logo somos bombardeados com muitas/múltiplas informações sobre os modos, como tal avanço tornará “mais fácil” as nossas vidas e como isso nos trará diversos “benefícios”! Quando se trata do ChatGPT, muita publicidade salienta a eficácia e comodidade de tal inteligência artificial que foi gerada e compartilhada, sugestionando ao leitor e/ou observador (depende de onde o sujeito viu a informação) a acreditar que haverá muitos benefícios ao utilizar tal recurso tecnológico. Entretanto, ponderamos que nos contextos das formações acadêmicas devemos compreender e investigar tais processos, escopos, modos e resultados de utilização, de como impactará na produção e difusão dos conhecimentos que produzimos.
Dessa forma, por mais que a premissa do protótipo possa parecer ‘inocente’, a resultante de sua utilização pode ser desastrosa, pois um software que produz textos e apreende ao mesmo tempo em que comandos são executados, se torna no mínimo desafiador e, dependendo das limitações crítico-reflexivas quanto aos usos, assustador, uma vez que a arte de escrever é algo que está atrelada à consciência e construtos “íntimos” do sujeito, a qual é uma atividade laboriosa, de autoria criativa e única. Assim, perguntamos:
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Live realizada pelo Grupo de Pesquisa Polifonia com os participantes Edilane Teles (PPGESA/UNEB); Adilson Citelli (MECOM/ECA/USP); Ricardo Bitencourt (IF-Sertão PE) e Romário Djavan (UNIVASF) |
• Com a interferência da tecnologia, os algoritmos “respeitarão” e/ou potencializarão uma atividade que levou tanto tempo para se desenvolver? Estamos diante de um novo/outro modo de compreender e agir?
Acreditamos que é preciso inicialmente conhecer, investigar e esclarecer os modos como entrelaçam nas ações do cotidiano, portanto, cautela, pois as facilidades que o ChatGPT proporcionam na elaboração de textos, por exemplo, pode interferir diretamente na ação criativa e intelectual da produção humana, direcionando as futuras gerações a utilizá-lo como "recurso", e aqui a proposição é maquínica, limitada, inclusive de "abreviação" entre o esforço, o resultado na produção e as outras atividades intelectuais que envolvem as aprendizagens.
As problemáticas referentes aos usos não devem ser limitadas apenas ao contexto acadêmico, como já foi salientado, a AI já demonstrou capacidade de simular atividades que só profissões específicas desempenham, e quando ocorre qualquer avanço tecnológico, o mercado de trabalho é sempre impactado. Com isso, levantamos outro questionamento:
Foto: Live "ChatGPT e os desafios para a Educação - II Encontro" com o participante Ricardo Bitencourt (IF- Sertão/PE).
• Mediante os avanços das inteligências artificiais, a humanidade ainda será protagonista ou apenas coadjuvante?
Isso dependerá da forma como as pessoas compreendem em sua(s) realidade(s) o(s) uso(s) de tais dispositivos, pois partindo para o lado do trabalho, quando se trata desse meio, o que se busca é a otimização de certas atividades, onde ocorra o menor uso do tempo e o maior retorno lucrativo, e os avanços com as tecnologias disponibilizam tais possibilidades, fazendo com que muitas profissões que antes eram indispensáveis se tornarem ‘dispensáveis’ diante dos “avanços” que promovem, uma vez que é mais vantajoso substituir a mão de obra humana pela(s) tecnologia(s); além de serem mais baratas, as máquinas não pensam nem questionam, apenas executam.
No âmbito educacional, o ChatGPT poderia ser usado como um “auxiliar”, na realização dos estudos e, espera-se, das aprendizagens (sobre isso precisamos de atenção, estudos e experimentações críticas, fundamentadas em pesquisas). Realmente, será que isso ocorreria? Na teoria pode ser que sim, mas na prática acreditamos que será bem difícil, pois a facilidade de acessar as informações, organizando “uma possível resposta” poderia retirar, por assim dizer, o entendimento crítico daquele que usa ao se apropriar das AI; em apenas um click, um “texto pronto” seria entregue a ser utilizado da maneira que quiser.
Ao entrar no meio acadêmico, algo que sempre é levado a sério é o plágio, pois apropriar-se da ideia de alguém (ou de redes e plataformas não identificados, como parece ser o caso) para utilizá-lo como se fosse próprio, é algo repudiado e, no mínimo, incoerente diante da produção humana de conhecimentos sistematizados em um determinado campo. Assim, salientamos:
• Se o ChatGPT utiliza um banco de dados já existente e o mesmo atualiza-se ao decorrer do tempo e usos, seria então todo texto produzido por ele um plágio ‘disfarçado’?
•E caso não se configure como plágio, existe alguma forma de verificar que os textos produzidos por ele são realmente autorais? De quem? Da AI?
• Como os professores em sala de aula se protegerão das produções acadêmicas depois do lançamento de tal ferramenta?
As reflexões aqui apresentada não pretendem ser alarmistas, entretanto, quando se coloca em xeque a produção de conhecimentos, deve-se levar a sério os impactos que uma inteligência artificial pode causar nos percursos temporais de usos e interações.
Por fim, acrescentamos ainda que fomos desde cedo cercados pelo imaginário hollywoodiano de que as inteligências artificiais acabariam com a humanidade, criando robôs, causando uma guerra nuclear e levando a extinção de todos, assim como foi mostrado no filme de grande sucesso como o Exterminador do futuro; não vislumbramos o fim, mas estejamos atentos, a humanidade pode correr perigo diante uma AI utilizada sem reflexão e/ou criticidade. Não trata-se de uma destruição em termos materiais, mas destruir diretamente aquilo que nos distingue dos animais e máquinas, que é o senso crítico e nossa capacidade de reflexão e criação, pois quanto mais nos tornamos dependentes das tecnologias e sua praticidade, mais difícil será de aceitarmos novos desafios. A construção de novos conhecimentos requer escrutínio e tempo, enquanto o mercado que cria as tecnologias busca praticidade e retorno imediato, portanto, O CHATGPT é um desafio à universidade e a produção acadêmica.
E você? O que pensa?
Para saber mais, acesse as duas lives que realizamos no âmbito do grupo de Pesquisa Polifonia - Observatório de Educação e Comunicação (DCHIII/UNEB):
Algumas referências consultadas:
O que é Chat GPT, impactos e como usar esta inteligência artificial? https://fia.com.br/blog/chat-gpt/ Acesso em 02/05/2023.
Itália bane ChatGPT por possíveis ameaças à privacidade. https://g1.globo.com/mundo/noticia/2023/03/31/italia-bane-chatgpt-por-possiveis-ameacas-a-privacidade.ghtml Acesso em 02/05/2023.
4 diferenças entre o ChatGPT e o Bard, chatbot de inteligência artificial do Google. https://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2023/03/23/4-diferencas-entre-o-chatgpt-e-o-bard-chatbot-de-inteligencia-artificial-do-google.ghtml Acesso em 02/05/2023.
Veja 10 profissões em alta para trabalhar com ChatGPT. https://g1.globo.com/trabalho-e-carreira/noticia/2023/03/23/veja-10-profissoes-em-alta-para-trabalhar-com-chatgpt.ghtml Acesso em 02/05/2023.
Textos e respostas a qualquer pergunta em segundos: mesmo sendo revolucionário, ChatGPT erra informações. https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2023/03/14/textos-e-respostas-a-qualquer-pergunta-em-segundos-mesmo-sendo-revolucionario-chatgpt-erra-informacoes.ghtml Acesso em 02/05/2023.
Universidades discutem as mudanças no ensino com o uso do Chat GPT. https://globoplay.globo.com/v/11353571/ Acesso em 02/05/2023.