Presente/futuro da formação docente: ensino remoto e EaD?

Multiciência 02 julho 2020
      
Temos sido desafiadas a propor ações que dialoguem com os obstáculos que a escola tem enfrentado na educação formal dos últimos três meses. E, nesse contexto, a formação inicial e continuada de professores, cujo processo de reinvenção da práxis pedagógica com o ensino remoto apresenta-se como um entendimento de criação e planejamento no ‘improviso’ e nas tentativas não previstas anteriormente, para o enfrentamento das dificuldades e significados da atuação docente em um período de distanciamento social. Nessa perspectiva, destaca-se nos tempos-espaços criados nos percursos profissionais, as incertezas e inconcretudes sobre os modos do fazer, se estão corretos e/ou coerentes, diante das ‘distorções’ entre decisões que defendem uma educação pública de qualidade, na garantia de acessos a todos ou a diversidade que temos visto, da participação parcial dos estudantes, em sua maioria de instituições privadas.

Esta breve introdução tem um pouco dos interesses que nos motivaram a realizar a pesquisa ‘Os desafios das Escolas e das famílias com o ensino remoto’ (Departamento de Ciências Humanas, Campus III, da Universidade do Estado da Bahia, DCH III/UNEB, 2020), cujo objetivo principal foi conhecer o cenário que se formava e que hoje ultrapassa mais de cem dias sem aulas presenciais para alguns ou sem aula nenhuma, para outros. Assim, o que dizer e fazer?

A primeira de nossas ações foi esta coluna, como um canal de comunicação com a comunidade, como espaço de socialização das reflexões pautadas nas interpretações e análises sobre as temáticas que emergem do cotidiano da educação, da escola e em casa. Por isso, os temas aqui pensados como meio para promoção dos diálogos: (a) a educação na pandemia; (b) a recepção e modos como tem sido realizada, portanto, compreendida por pais, alunos, professores e gestores; (c) a lembrança de ações basilares à educação de crianças e adolescentes, como a importância de uma rotina diversificada, que respeite suas fases de desenvolvimento, promovendo outras ações que os ajudem a superar este momento e, ao mesmo tempo dar continuidade aos processos de aprendizagens, com o necessário incentivo à leitura desde o nascimento. Assim, foram muitos temas, que seguimos descrevendo a partir das pautas expressas pelos protagonistas da educação, até chegarmos à motivação atual que nos convida e desafia a promover não apenas reflexões, mas ações reais que visem dialogar o fazer dos professores com o ensino remoto.

Sobre este percurso, tivemos na live realizada em 15 de Junho de 12020, com o tema “Propostas e ações das redes de Ensino para a Educação”, com representantes dos municípios que compõem a região no qual o DCH III está situado, no médio São Francisco (Juazeiro, BA e Petrolina, PE), que nos proporcionou um panorama de como tem sido enfrentada a questão. Assim, entre invenções e apropriações nos modos de fazer das secretarias e sistemas de ensino, nas pautas apresentadas, emerge a formação continuada como uma das primeiras a ser retomada na pesquisa e nas ações, tanto aqui, como na implementação das etapas de interpretações e entendimentos que envolvem a investigação e as tentativas em responder a nós mesmos e a comunidade.

É válido ainda afirmar que a temática ‘Formação de professores’ foi uma solicitação de um docente que leu a coluna e perguntou: “e a formação? Como promover neste período da pandemia?”. Muitas proposições vêm à tona, pois em nosso país, as escolhas para lidar com o vírus se configurou em um verdadeiro problema! Que diversamente de outros países, não tem uma orientação construída de forma coletiva com as instituições e estados para a educação, as orientações são interpretadas e seguidas, às vezes, em direções diversas. A citar uma delas, a exclusão de alunos da escola pública, pois nem todos têm acesso e acompanham o ensino remoto, o que diverge das instituições privadas, que tem uma frequência e participação em quase totalidade dos discentes. Um processo desigual, injusto e excludente!

Assim, falar de formação inicial e continuada inclui nesse cenário outras reflexões que envolvem a atuação docente hoje com o ensino remoto e as pressões que têm sofrido os professores, como: (a) suspensão de contratos temporários dos profissionais em diversas prefeituras ( há relatos de diferentes cidades do país); (b) a diminuição da carga horária de professores em instituições privadas e consequentemente de salário, muitas vezes chegando até a demissão; (c) a realização de aulas remotas pelo professor para um número maior de estudantes, se antes as turmas tinham 35 alunos, hoje as aulas são transmitidas para 60 e, nesse contexto, geralmente o entendimento das ‘empresas’ que vendem os pacotes à educação privada, propõem a ‘ideia’ ilusionária de que com menos professores podem oferecer ‘aulas para mais alunos’ nas plataformas, desconsiderando as outras dimensões da formação; (d) o desafio ‘tardio’ dos municípios que não ofertaram aulas remotas, por falta de condições e agora por conta da não perspectiva de superação da ‘curva de contágio’ e vislumbre do final da pandemia, retornam na decisão e buscam ofertar atividades remotas. Enfim, podemos aqui elencar uma série de questões, mas preferimos destacar e apresentar possibilidades, assim como tentativas do fazer. A seguir algumas reflexões sobre os conceitos e a prática pedagógica em estudo:

• A primeira delas é a diferenciação entre EaD e o ensino remoto, que algumas vezes acenamos que não são iguais, entretanto, é preciso maior pontualidade conceitual e teórico-metodológica, uma vez que não se trata de um entendimento apenas aos profissionais da educação, bem como a toda sociedade; é preciso esclarecer que não trata-se da mesma coisa; 
• Como afirmou Andrea Ramal em entrevista cedida ao jornal O Globo, ‘Ensino remoto não é ensino a distância’, pois terminado este período, que passou da perspectiva de quarentena a distanciamento social que muitos não fazem, as aulas não podem retornar, portanto, será preciso cuidar do emocional dos alunos, dos professores e demais profissionais da educação, além de rever todo o conteúdo do período; 
• O que as secretarias de educação e escolas têm feito é um esforço louvável e admirável (nossa gratidão), em adaptar-se a este universo online, até envio de material impresso, mas que saturam pela repetitividade. Assim, de uma rotina escolar (para aqueles que continuam estudando), de uma aprendizagem construída com mais limitações que as promovidas nas aulas presenciais, é perpassada pela dúvida sobre o quanto os estudantes têm aprendido, ou ainda, como promover e/ou adotar um ‘ensino híbrido’, que relacione em futuro, as modalidades presenciais e EaD, estudo iniciado faz muitos anos, mas que no momento encontra nas decisões aceleradas e emergenciais, a demanda e reconhecimento de ampliação da discussão das TIC’s (Tecnologias da Informação e Comunicação) e mídias na educação;
Assim, compreender e buscar superar o processo acelerado que vivemos, com um planejamento construído na emergência e improviso é uma problemática não prevista na formação inicial e continuada de professores, promovida com quase exclusividade para a abordagem presencial. Nesse sentido, afirmamos: não temos tempo, tampouco é coerente desconsiderar os processos formativos em uma situação emergencial e completamente nova como esta, além de compreender que as ações são de ensino remoto e não de educação a distância. Se podemos afirmar algum ganho diante do que temos vivido, foi a garantia e manutenção do vínculo na promoção e continuidade das aprendizagens escolares (mesmo com a dificuldade de serem mensuradas), e o crescente uso das TIC’s e plataformas digitais, promovendo assim, aprendizagens construídas na ‘obrigação’, por falta de outra alternativa.

Portanto, o primeiro esclarecimento a ser compreendido é sobre a diferença entre a educação a distância e o ensino remoto. A seguir uma proposição de diferenciação:





Importante salientar que o engajamento crescente dos profissionais da educação nos convida a incluir e promover uma formação inicial e continuada com mais possibilidades para (re)pensar o ensino híbrido, abrangendo as tecnologias digitais e mídias, entre o presencial e a distância. Para isso é preciso potencializar e promover formatos e modos diversos, pois se não estávamos conseguindo realizar tal intento antes da Pandemia, que passemos a partir de agora, a conhecer mais e compreender as práticas que têm funcionado nas experiências atuais. Para isso é preciso alterar os movimentos das nossas próprias elaborações com a educação formal, na busca por melhorias e qualidade para todos.

A formação docente se faz no processo de construção das experiências e com constância.

Artigo produzido pelas responsáveis e organizadoras da Coluna Polifonia







Adriana Maria Santos de Almeida Campana

Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Educação, Cultura e Territórios da Universidade do Estado da Bahia (PPGESA/DCH III/UNEB. Membro do Grupo de Pesquisa em Educação Contextualizada, Cultura e Território - EDUCERE. Email:didacampana@yahoo.com.br.


Edilane Carvalho Teles

Doutora em Comunicação pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade de São Paulo (PPGCOM – USP); Docente da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Departamento de Ciências Humanas, Campus III. Vice-Líder do Grupo de Pesquisa em Educação Contextualizada, Cultura e Território - EDUCERE. E-mail: edilaneteles@hotmail.com.





Fernanda Lima Souza
Mestre em Gestão e Tecnologias Aplicadas à Educação (GESTEC/UNEB. Membro do Grupo de Pesquisa em Gestão Educacional e Formação de Gestores, NUGEF. Pós-graduação (Lato Sensu) em Administração e Planejamento de Projetos Sociais pela Universidade Veiga de Almeida RJ (2007), Pós Graduação (Lato Sensu) Gestão Educacional pela Pitágoras e Pós-graduação (Lato Sensu) em Gestão Pública Municipal pela UNEB. Graduada em Pedagogia com Habilitação em Supervisão Escolar pela Faculdade de Educação da Bahia (2004). Arte-educadora, ex-presidente do CMDCA e FUNDEB. Atualmente trabalha na Coordenação Pedagógica da Secretaria Municipal de Educação de Itapicuru, professora da Faculdade Dom Luiz- BA e consultora educacional.

Ilustração: Melo, estudante de Jornalismo em Multimeios

Fontes: Para acessar a live, clique aqui
Para ler a matéria de O Globo, clique aqui.