No meio do caminho tinha... Arte

. 15 dezembro 2008
Artesanato é o que vem sendo produzido com as pedras em Juazeiro

Sob o barulho das máquinas, os aprendizes começam a moldar suas peças. Corujas, peixes, tartarugas, golfinhos..., pacientemente e sob mãos cuidadosas, são criadas peças para decorar diversos lares. Antônio Lisboa trabalha com o artesanato mineral desde os 12 anos. Conheceu a atividade através de um programa social voltado para o segmento que aproveitava as sobras dos minerais destinados a marmorarias.

Depois de fazer o curso em Santa Maria da Boa Vista (PE), Lisboa foi instrutor de núcleos na cidade, em Petrolina (PE) e em João Pessoa (PB), e começou a participar das feiras de artesanato. Hoje, tem um ateliê particular, onde vende peças para diversos estados e é instrutor do Centro de Lapidação, Artesanato e Adorno Mineral de Juazeiro (BA). “Decidi ser artesão até o final da minha vida, não quis outra coisa, é o que gosto de fazer”, revela.

Segundo o artesão, a pedra mais utilizada no curso é o calcário, que tem dureza três, na classificação de 1 a 10, e por ser um minério que possui variedades de cor: branco, cinza, preto, amarelo e verde, além disso, é uma pedra exótica.

O trabalho artesanal se caracteriza pela produção manual, na qual o artesão é responsável por todas as etapas de produção, desde a escolha do material até o acabamento final. Com o artesanato mineral não é diferente. Para produzir uma peça decorativa, é necessário definir qual desenho será feito, escolher o tipo e o tamanho da pedra, formar, polir e lixar.

Lisboa garante que costuma produzir porta-lápis, chaveiros, mandacarus, cactos, porque são peças mais aceitas. De acordo com o tamanho e rotatividade, as peças podem variar de quatro reais a dois mil, mas os souvenires, artefatos mais vendidos aos turistas, variam de cinco a dez reais.


POLÍTICA DE GERAÇÃO DE RENDA

Nos estados da Bahia, Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte esse trabalho funciona como política pública voltada para a geração de emprego e renda, viabilizada através de escolas e unidades de artesanato mineral.

Na Bahia, essa atividade, teve inicio em 1984, em Campo Formoso, por meio da Companhia Baiana de Pesquisas Minerais (CBPM), que integrou e transformou o curso de formação de lapidários já existente na cidade, em uma escola de artesanato mineral e de lapidação de gemas. O número de centros foi ampliando e hoje são 62 escolas de artesanato mineral na Bahia.

A atividade tem possibilitado a inserção no mercado de trabalho para muitos públicos (adolescentes, aposentados, portadores de deficiência, etc), pois independe de escolaridade. “Eu pensava que ia ser mais difícil, por que é tanta máquina, tanta coisa... Mas não, é fácil, bem legal mesmo.” diz a aprendiz Francineide da Silva Jesus, moradora do bairro Itaberaba que está desempregada e depositando expectativas na produção de artefatos culturais, através do Centro de Lapidação, Artesanato e Adorno Mineral de Juazeiro.

Com a participação feminina cada vez mais freqüente no mundo do trabalho, seja para complementar a renda da família ou para garantir sua autonomia, muitas mulheres têm sido atraídas pelo setor. Geraldina Alves de Matos, participante do Clube Mães Guerreiras da Luz, do bairro Dom José Rodrigues em Juazeiro, faz o curso de adorno mineral e está aprendendo a fazer brincos, pulseiras, colares e anéis no Centro. Ela pretende repassar o que aprendeu para outras mulheres.

Para o artesão e instrutor do curso de artesanato decorativo Antônio Lisboa, a produção de objetos minerais pode ser fonte principal ou complementar da renda, além de permitir ao trabalhador definir sua carga horária de trabalho.

O impacto socioeconômico pode ser visualizado através da formação de cooperativas, associações e micro empresas. O capital inicial é baixo e a matéria-prima pode ser adquirida por preços acessíveis. A margem de lucro está atrelada ao minério utilizado, à qualidade e ao design da peça, bem como à colocação dos produtos no mercado atacadista. Por isso a produção coletiva é estratégica para a comercialização.

Para vender as peças artesanais produzidas, o presidente da Associação Intermunicipal dos Garimpeiros do Médio São Francisco, Antonio Cursino da França, recomenda participar de feiras nacionais e internacionais, criar uma página na internet com mostruário das peças em catálogos, além de uma política de comunicação para dar visibilidade aos produtos. Ele acrescenta ainda que muitas pessoas que trabalham com pedras preciosas dificilmente abandonam a atividade. “A pedra encanta qualquer pessoa que se aproxima. Quem entra em contato com ela se sente atraído e passa a trabalhar com a mineração”, defende.

O instrutor Normanildo Luís dos Santos Cardoso vê o artesanato como uma atividade a ser praticada pelos jovens, como forma de ocupar a mente e não se envolver com as drogas. Deste modo, pode funcionar como uma terapia.

Carlos Drummond de Andrade, em seu livro Alguma Poesia diz:

“No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.”

Agora, temos arte. Em situações difíceis, o homem pode descobrir outros caminhos de vida e de profissão. Eis, uma alternativa.


Por: Naiara Soares (texto e fotos)