O ensino de música como ferramenta para o aprendizado

. 30 setembro 2009



Sons dos mais variados tipos invadem as salas do Instituto Federal Tecnológico (IF-Sertão) em Petrolina. São notas musicais que entram por toda parte, e tocam a alma de quem ouve, causando arrepios e fascínio dos espectadores. Os alunos estão concentrados, olhos atentos, ouvidos apurados. O local é o mesmo de antes, mas com elementos que tornam o ambiente diferente. As carteiras e livros agora dão lugar a instrumentos e partituras, a novos signos, novas linguagens que podem ser interpretados por todos os sentidos. Flautas, saxofones e violinos são as novas ferramentas de aprendizagem. Esta é a realidade das escolas que adotaram o ensino de música em seu currículo.

Na década de 30, a disciplina de música foi introduzida na grade curricular das escolas brasileiras. As crianças cantavam e formavam grandes corais, apresentando-se em estádios de futebol, centros de convenções e outros, especialmente em datas comemorativas. O músico Villa-Lobos considerava que um compositor sério deveria estudar “a herança musical do seu país, a geografia e etnografia da sua e de outras terras, o folclore de seu país, quer sob o aspecto literário, poético e político, quer musical.” Assim, a música não é apenas um código a ser aprendido, é uma fonte de cultura e de conhecimento histórico compondo a identidade de cada povo.

O professor Adailson Pinheiro dos Santos, que realizou pesquisa sobre o ensino de música em uma das escolas em Juazeiro, afirma que, ao inserir atividades musicais nos conteúdos escolares, o aluno desenvolve linguagens, conhece palavras, contextos históricos e culturais diferentes, auxiliando na aprendizagem de outras disciplinas. Os estudantes que têm acesso à música, principalmente à clássica e à erudita, desenvolvem maior facilidade de concentração e de raciocínio, como declara Adailson. Outros estudos consideram que eles se tornam mais disciplinados e com sensibilidade artística mais aguçada.

Dos tempos de Villa-Lobos para os dias atuais, muita coisa mudou. Na década de 70, a disciplina de música, que antes era obrigatória, foi mudada para Educação Artística, matéria que possibilita o ensino de várias artes, deixando a critério de cada professor aplicar a arte da forma que lhe fosse mais acessível. Nas décadas de 60 e 70, quem possuísse certa habilidade com desenho, por exemplo, ensinava arte na escola. Essa mudança interferiu no aprendizado da música que foi, aos poucos, deixada de lado.

Hoje, são poucos os professores que utilizam esta ferramenta em sua metodologia de ensino, seja por falta de interesse, ou, como na maioria dos casos, por ausência de formação específica, como relata o professor Ozenir Luciano da Silva, licenciado em música, que há 13 anos trabalha com educação musical e, atualmente, coordena a orquestra sinfônica Opus 68, formada por alunos do IF-Sertão Pernambucano, em Petrolina.

Na tentativa de resgatar a aproximação dos alunos com a música, foi sancionada em 18 de agosto de 2008 a lei n.º 11.769, que torna novamente obrigatório o ensino de música nas escolas de ensino fundamental e médio. A lei causou polêmica, pois muitos questionaram a necessidade da disciplina no currículo escolar e, também, se o governo forneceria as condições necessárias para que a lei seja cumprida. “A medida é louvável, nós precisamos sair desse processo de desmusicalização. O que as pessoas gostam de ouvir hoje, infelizmente é resultado da educação que elas receberam. No entanto, nós precisamos saber quem serão esses professores para que não aconteça o que aconteceu na década de 70,” afirma o professor Luciano.

Para o professor, a inclusão da música nas escolas é de fundamental importância para a formação do aluno. O estudante passa a ter senso crítico, aprende a gostar de uma banda e dizer porque ela é boa e porque ela não é, passa a ser alguém que pensa com os sentidos da audição, se torna um ser pensante. “Na escola, não é preciso formar o músico, mas sim, o ouvinte”, afirma o professor.

A música pode ser considerada um instrumento de inclusão cultural, os alunos se aproximam de culturas diferentes da sua, tem acesso a bens culturais que, até então, eram reservados apenas as parcelas mais favorecidas da população. “Isso que você vê aqui, você só vê na televisão. Os pais desses alunos se sentem honrados ao verem seus filhos participando de um projeto como esse, que além de tudo é gratuito”, declara o professor, comentando a respeito do seu trabalho, onde em meio a instrumentos e partituras, os alunos se dedicam e sentem prazer pelo que fazem.

“Você passa a ver a música com outros olhos. Aquilo que a gente não dava muita importância, como, por exemplo, os grandes músicos como Bach, Beethoven, que eu considerava música de funeral, passou a ter outro sentido para mim”, afirma entusiasmada a estudante Miralva dos Santos, que, aos 17 anos, participa do projeto Opus 68 no IF de Petrolina e aprende música na mesma escola onde cursa o ensino médio. Com um sorriso no rosto, ela fala da satisfação que sente por ter acesso a esse tipo de conhecimento. Miralva relata que a música ampliou os horizontes do seu aprendizado e modificou sua forma de ver a vida.

Para professores e especialistas, o ensino de música colabora para uma boa formação social e intelectual do indivíduo. Seus benefícios podem ser evidenciados através de projetos bem sucedidos como o da orquestra Opus 68 em Petrolina, e outros realizados em várias escolas do país. Contudo, um ano após a implantação da lei, houve poucas mudanças. A maioria das escolas não tem os recursos necessários para oferecer um bom ensino de música aos seus alunos. As instituições de ensino receberam o prazo de três anos para se adaptarem à lei. Agora, resta saber se o poder público dará as condições para que a lei seja cumprida.

Por Nilzete Brito (foto e texto). Matéria publicada com exclusividade no jornal Folha do São Francisco, desta semana.