Para todas as crenças

. 13 setembro 2009

Lojas de artigos religiosos demonstram diversidade cultural de Juazeiro e Petrolina

Imagens de Iemanjá, do Preto Velho, de Orixás, figuras de Jesus Cristo e do sagrado coração de Maria. Crucifixos, fórmulas de banho para atrair emprego ou livrar-se de um desafeto. Velas de sete dias, carrancas em pedra sabão e terços. Esses elementos formam um cenário curioso, no qual diferentes crenças parecem dialogar nas prateleiras de lojas de produtos de cunho religioso e artístico, localizadas nas cidades de Petrolina e Juazeiro.

Os consumidores vêm dos mais diversificados credos e com diferentes objetivos. Alguns, quando chegam, vão logo à mercadoria que desejam, talvez para desviar de imagens pelas quais foram orientados a manifestar indiferença. Outros clientes até sabem o que querem, mas ficam um bom tempo observando alguns produtos admirando-os. Ainda existem pessoas que apenas visitam as lojas para contemplar toda a imensidão de peças, desde grandes carrancas no chão às capas de LPs na parede.

A recepcionista Gleide Silva freqüenta a loja Destaque Artesanato há mais de 20 anos, e diz que o que a atraiu foram as grandes peças de madeira, como as carrancas. “Quando era mais jovem, às vezes vinha para a loja somente observá-las”, conta. Hoje, ela costuma comprar pequenos souvenires em madeira. Sobre as imagens de outras religiões, Gleide, que é católica, diz não ter nada contra e que até as admira.

No centro de Petrolina e de Juazeiro, três lojas vendem artigos religiosos. Visitá-las é uma forma acessível de ver o artesanato local e conhecer outras culturas. Seus vendedores convivem diariamente com tantas crenças e, ainda assim, mantêm a sua fé. Através do diálogo com os clientes, eles adquirem novos conhecimentos sobre outras doutrinas. Sempre esclarecem turistas e clientes que tentam comprar certos itens que não conhecem, a exemplo dos que são destinados a fins específicos como trazer azar para a vida de alguém.

“As pessoas ficam curiosas quando passam pela loja, algumas até têm medo de entrar, achando que vai acontecer alguma coisa de ruim”, diz o vendedor Sérgio Luciano, da Destaque Artesanato.

Funcionando num prédio centenário do centro de Juazeiro desde 1973, que conserva o piso de cedro e as enormes portas, típicas de casarões antigos do século XIX, a loja iniciou suas atividades comercializando peças de artesãos locais, depois expandiu para o segmento de artigos religiosos. Luciano diz que, antigamente, as carrancas eram o carro-chefe da loja, e se queixa que o ramo do artesanato já foi mais lucrativo. “O mercado se expandiu. Já foi muito mais promissor do que é hoje”, afirma.

Grande parte dos clientes compra as peças pelo seu caráter artístico e cultural, como conta Luciano. O local, que já foi uma padaria e um bar, há 20 anos faz parte do roteiro turístico da cidade. Hoje, é visitada por turistas brasileiros e de outros países.

Localizada num pequeno ponto entre a praça do Bambuzinho e a praça do Galo, no centro de Petrolina, a loja “Santa Rita” foi fundada em 1981. No seu entorno, há bancos, lojas de produtos agrícolas, de confecções e dois restaurantes, o que acaba atraindo grande número de pessoas para a região.

O estabelecimento poderia até passar despercebido, pois sua porta é um pouco recuada em relação às demais lojas, e tem uma banca de doces na frente. Em seu interior, há pequenas imagens coloridas de santos. Apesar da variedade, o local recebe poucos turistas, declara a vendedora Rita Vieira dos Santos.

Os campeões de venda são os itens usados para conseguir determinada graça como, por exemplo, arranjar namorado, dinheiro, trazer sorte ou adquirir tranquilidade.

O significado dos produtos expostos varia de acordo com as crenças de cada freqüentador. Afinal, tudo depende de quem vê e com qual intenção. Muitas vezes as opiniões acerca dos artigos expostos e até da proposta dessas lojas apresentam divergências. Mesmo devotos cristãos procuram essas casas para adquirir produtos com fins meramente estéticos.

No intervalo entre um final de missa, numa noite de sexta-feira, em sua volta para casa, o padre Francisco José Pereira disse já ter comprado uma imagem pela beleza estética e por representar determinado valor artístico-cultural. “Se compro uma imagem de Buda, não é por que eu seja budista, nem tenha a cabeça na doutrina budista, é mais pelo aspecto artístico-cultural”, afirma.

Na sala do seu consultório de psicanálise, ambientado com canções de New Age, o pastor da Igreja Batista, teólogo e psicanalista Waldeck Souza de Oliveira disse já ter passado várias vezes próximo a lojas de produtos esotéricos, mas nunca entrou. Oliveira diz que, quando passa e olha para esses estabelecimentos, reflete sobre uma “mistura que confunde e não define o que é” aquela loja. O pastor acredita que não há a intenção dos vendedores em induzir a religião em alguém, mas a de comercializar um produto.

Se os itens que figuram nessas lojas representam somente arte ou comércio, é o repertório cultural dos seus frequentadores que irá definir. O importante é o abrigo que estes recintos dão a manifestações culturais de um povo tão diverso quanto os objetos diariamente expostos. Basta um olhar mais detalhado para identificar a riqueza cultural desses ambientes, que acaba despertando a curiosidade de quem admira.

Por Raoni Santos