Parte II - “Sou o último comunista marxista-leninista de Juazeiro”

. 02 agosto 2010
Faltando dois anos para a maioridade, em 1936, um amigo de João o convidou para alistar-se na Polícia. Ele pediu à mãe que assinasse um documento permitindo a viagem à Salvador. Na capital, foram para Vila Militar e no outro dia fizeram todos os exames para que pudesse se incorporar. No entanto houve um empecilho, ele era menor de idade, sendo assim não podia alistar-se sem a permissão dos pais. “Eu vendo a situação difícil, tinha a necessidade de ser soldado para ganhar 177 mil cruzeiros. Foi quando tive uma idéia, fui à Praça da Sé e disse a um Juiz que eu era um menino criado na rua, órfão. Pedi a ele autorização para entrar na polícia, graças a Deus, o juiz me deu. Consegui me alistar no dia 5 de Janeiro de 1940, na Polícia da Bahia”, conta João.

João Lopes passa a servir a polícia dos Dendezeiros. Nesta época, aconteceu um dos episódios mais marcantes de sua trajetória. Durante a passagem do capitão Péricles Barbosa aos Dendezeiros, João ficou sabendo da Volta de Belém, uma corrida realizada em Belém do Pará para oficiais de todo o país. Dentre os 653 recrutas seriam escolhidos 30 rapazes que seriam treinados para competir na corrida. Assim todos os selecionados seriam enviados a cidade de Salvador, onde ocorreria a primeira eliminatória. Mesmo não sendo um dos escolhidos, pediu permissão para treinar, com seu bom desempenho permitiram que ele participasse da competição. Toda a Polícia teve uma grande surpresa quando João chegou em primeiro lugar e foi o campeão baiano.

Chegado o dia da Volta de Belém, início dos anos 40, havia 700 homens competindo na prova. O presidente Getúlio estava presente no evento. Antes de começar a corrida, os competidores se aqueciam e riam por achar inadequado a participação de um menino. “Era um garoto de 19 anos, franzino, 1,67 de altura e 47 kg. Não intimidava ninguém, mas naquele dia consegui o improvável. Lembro que no desenrolar da competição, eu fui ganhando posições. Quando vi já disputava o primeiro lugar. Por onde eu passava era festa e muitos aplausos. Porém, faltando 1km para o término da prova. O Lupécinio de Almeida, representante do Maranhão, me alcançou, um sujeito alto, forte e robusto. E aproveitando da minha inexperiência em corrida, me empurrou. Depois disso desequilibrei, mas consegui me recompor. Foi uma cena marcante, cheguei em primeiro lugar. Todos vinham me cumprimentar, inclusive o jornal Folha do Povo fez uma matéria cuja a manchete dizia o seguinte: campeão baiano acaba de fazer o percurso de 24m ”, narra João, rindo de suas peripécias.

Diante da vitória, o presidente Getúlio marcou uma audiência com o vencedor. Mas não foi para parabenizá-lo, e sim averiguar um incidente que tinha acontecido durante a viagem a Belém. Na época, o recruta já tinha tendências socialistas e lia sobre Prestes, Marx e Lênin. João Lopes fez amizade com um cabo do exército. Em natal, este rapaz lhe chamou para visitar a casa da namorada, ao chegar na residência da moça foram surpreendidos com a presença do comandante, que estaria lá para prender o cabo sob acusação de ter feito um motim em 1930, assassinado pessoas e pertencer à Aliança Libertadora Nacional (ALN). Durante a conversa, Getúlio pergunta se João quer ser promovido a oficial da polícia. “Eu preferi que, em troca da minha promoção, Vargas soltasse o rapaz. Ele me disse que iria fazer quando chegasse ao Rio de Janeiro, um decreto de anistia, perdoando o comunista dos crimes cometidos”, descreve João.
Por: Juliane Peixinho
Acompanhe !!!