Patrimônio genético do cavalo nordestino ainda é desprezado

. 04 setembro 2010
No Brasil, o cavalo nordestino ainda é pouco valorizado, muitos o consideram um animal magro, sem função específica e sem serventia. Entretanto, o animal tem um rico patrimônio genético, possui diversas funções, contribui para o desenvolvimento econômico do país e tem um potencial adormecido, que muitos desconhecem, como a capacidade de resistência e rusticidade. Quem afirma é o técnico da Agência Estadual de Defesa Agropecuária da Bahia (ADAB) e pós-graduado em Gestão Ambiental, Luis Cléber Soares Machado, coordenador do projeto Cavalo Nordestino. Em entrevista à Agência Multiciência, Machado defendeu a preservação da raça e esclareceu formas de manejo, como o cavalo reage muito bem ao pasto ralo e tem uma boa adaptação ao tempo sem chuvas.

Multiciência- Qual a importância da raça Cavalo Nordestino?
Luis Cleber- Ele é um rico patrimônio genético que se encontra desprezado. A importância é de somar e preservar mais um rico banco genético que está sendo desprezado no Brasil, pois sabemos que as raças nativas são responsáveis pelo melhoramento de todas as raças modernas. Contudo, queremos salvá-lo da extinção. Ele é um cavalo resistente, rústico, responde muito bem a pouco tratamento, cascos rígidos, não precisa de ferradura, são animais que têm muito a oferecer, mas possuem um potencial adormecido e queremos mostrar para as pessoas.

Multiciência- O que é o Projeto Cavalo Nordestino?
Luis Cleber- Ele nasceu da iniciativa minha com Carlos Augusto, conhecido como Macaxeira na região. Nós somos apaixonados pela raça, digo raça porque foi catalogado inicialmente em 1972 pelo Ministério da Agricultura e, em 74, foi criada a Associação Brasileira dos Criadores do Cavalo Nordestino, que existiu em Recife até o final da década de 80. Porém, ela não foi extinta da maneira correta, ou seja, não foi publicada no Diário Oficial. Nós já obtivemos informações junto ao Ministério da Agricultura onde estamos viabilizando a criação e a reativação da Associação em Juazeiro. Agora, estamos recolhendo as assinaturas para um requerimento a ser enviado ao Ministério da Agricultura solicitando a extinção oficialmente. Depois de extinta, a gente vai criar a nossa, já temos o Estatuto da Associação e o regulamento do registro semiológico. Toda Associação de uma raça, seja de qualquer espécie, é obrigado a ter um registro.

Multiciência- Qual a viabilização do projeto Cavalo Nordestino?
Luis Cleber- Temos uma parceria com o zootecnista Jânio Benevides de Melo, professor da Universidade Sudoeste da Bahia (UESB) que faz o doutorado “Discriminação Fenotípica do Cavalo Nordestino Atual” na Universidade Rural de Pernambuco (UFRPE). Nesse estudo, em cada animal, ele retirou 47 medidas para montar um banco de dados para cruzar as informações e identificá-las. Ele mediu cavalos na Bahia, em Pernambuco e no Piauí para saber como está o padrão racial e a formação fenotípica atual. Nós já estamos com alguns animais fazendo a seleção deles e o maior problema do cavalo nordestino é a fome secular.

Multiciência- O que significa esta problemática da fome?
Luis Cleber - Nós primamos por um manejo alimentar sanitário e reprodutivo correto sem esquecer a resistência e a rusticidade. Os animais de reprodução são praticamente criados a pastos, as éguas e os poltros recebem um complemento da ração, que seria um concentrado somente de milho triturado com sal e o pasto. O resultado é muito bom e sempre oferecemos uma boa condição alimentar. Geralmente, as pessoas têm uma visão errônea, discriminatória em relação ao cavalo nordestino porque se tem a imagem daquele cavalo peneirado, magro, esquelético que não tem serventia, na realidade não é isso. Porém, a raça está depreciada, então tem que se fazer uma seleção dos melhores indivíduos.

Multiciência- Existe alguma tecnologia utilizada para trabalhar com o Cavalo Nordestino?
Luis Cleber- Trabalhamos com bom manejo alimentar, com boa oferta de volumoso (comida de pasto). A tecnologia é a mais simples possível, pois é um animal que responde muito bem, é pouquíssimo o que se oferece a ele. Não precisa ter esse investimento e tecnologia toda, somente entender um pouco sobre nutrição animal para não cometer erros grosseiros que possam afetar até a saúde do animal e não se levar por modismos.

Multiciência- A venda do Cavalo Nordestino tem boa oferta?
Luis Cleber- Nós estamos querendo que os animais sejam valorizados, a questão comercial é uma consequência do trabalho. Porém, primeiro é a preservação da raça e a seleção desses animais para mostrar o seu potencial em termos de função: esporte, passeio, tudo. É um animal que tem multi funções.

Multiciência- Quais são os investimentos utilizados para o desenvolvimento do projeto Cavalo Nordestino?
Luis Cleber- Nós estamos buscando parcerias com instituições de iniciativa privada e pública, entidades de ensino de pesquisa que possam desenvolver trabalhos e pessoas que queiram participar.

Por Raianne Guimarães (texto) e Emerson Rocha (foto)

Texto publicado com exclusividade no Jornal Gazzeta do São Francisco, edição de quarta-feira (01/09).