Por Monique Rios, texto e foto.
Como a maioria dos que vivem no distrito, Eurico não é filho da terra. Desembarcou na região no início dos anos 80, vindo da comunidade de Surubim (PE). A partir desta data o lugar passou a ser o ponto de partida de seu roteiro de viagens. Ele não costuma ficar muito tempo em um mesmo lugar e alterna sua estadia entre Pinhões, Uauá e Surubim, mas sempre volta ao Pilar, por isso foi adotado por todos.
Muitos o viam como uma personagem surreal, meio louco, que aparecia uma vez ou outra caminhando pelas ruas da comunidade. Logo foi se tornando familiar, parte integrante do povo e das memórias do local. Com seu jeito brincalhão e simpático, foi escolhendo vários parentes de coração.
Aos poucos, foi chamando de mães, pais, irmãos e primos, todos aqueles que cuidam dele.
Sempre que perguntam: “Ei, você é o que meu? - “É meu parente”, responde Eurico que passa boa parte do dia na rua, conversando com todos que encontra pelo caminho. Às vezes, dançando e até pedindo dinheiro. Pela manhã, passa na residência da dona de casa Ivone Rodrigues, a quem chama de mãe, para tomar banho. Depois, segue para um pequeno hotel do distrito onde faz suas refeições e, à noite, dorme na casa de ‘seu’ Severino, outro morador da comunidade. Sua memória aguçada e tranquila, funciona como uma filmadora que armazena tudo que percebe observando o dia a dia dos moradores. E haja histórias pra contar.
Eurico sempre foi calmo, jamais ofendeu alguém. Gosta de festa, de dançar e de ouvir músicas. Tem gosto eclético. Adora cantar músicas de Luiz Gonzaga, Caetano Veloso e Amado Batista. Também sabe de cor as rezas que lhes foram ensinadas pela mãe, a quem expõe seu respeito. Sua paixão obsessiva são mesmo as bicicletas. Já ganhou muitas, mas todas acabam sendo roubadas.
Viajante que é, adorava fazer o percurso do Pilar ao Surubim pedalando. Por conta dos perigos das estradas, acabou deixando o hábito de lado. Pelas ruas da Vila, ele pedala as bicicletas doadas ou emprestadas, sempre gritando: “Esta aqui tem dono. Comprei e paguei, não é roubada não”, faz questão de dizer. O amor por bicicletas é incondicional que até o deixa de olhos brilhando. Quem quiser vê-lo assustado é só falar em morte. O pior assunto para ele. Tem total aversão ao fim da vida. O medo é tanto que, mesmo depois de já ter passado dos 50 anos de idade, não quer avançar no ciclo da vida. “Tenho 18 anos, tenho 20 anos”, costuma dizer.
Agora, imagine seu pavor ao pedir carona na estrada e descobrir que dentro do carro havia um caixão. E isso aconteceu certo dia. O medo foi tanto que pulou do automóvel para não fazer a viagem ao lado de sua inimiga: a morte. Outro apego é com a higiene pessoal. Tem paixão por comprar sabonetes e perfume. Toma banho várias vezes por acreditar que, se não fizer isso, vai morrer do coração.
Mas o boato só foi desfeito quando um policial encontrou Eurico na estrada gritando: “Eu não morri, estou vivo!”. Depois do susto passado só restou a ele rir de quem achou que a notícia era verdadeira. Por sinal, ele já havia combinado com a mãe adotiva Ivone, “Mãe, a gente não morre nunca, né? Nunca, nunca, nunca.”.
Monique Rios é graduanda em Jornalismo em Multimeios.