Pesquisadores baianos defendem uma
nova reformulação econômica com participação efetiva da sociedade civil
Estagnação, instabilidade econômica e
três anos seguidos de taxas de crescimento negativas são algumas das
dificuldades enfrentadas pela economia brasileira. Aliada a isso, a incerteza
dos seus rumos para a próxima década prejudica uma tentativa de saída da
recessão. Segundo dados divulgados na Carta de Conjuntura – número 33, do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea), o resultado primário acumulado das
contas públicas até outubro de 2016 totalizou um déficit de R$ 45,9 bilhões e,
no acumulado em 12 meses, registrou-se saldo primário negativo de R$137,2
bilhões (2,33% do Produto Interno Bruto – PIB).
A economia brasileira é fundamentada
no modelo de tripé macroeconômico, o qual se baseia na meta da inflação, na
meta fiscal e no câmbio flutuante. Segundo o regime cambial adotado no Brasil,
o preço de uma moeda em relação à outra varia de acordo com sua oferta e
procura. A meta fiscal ou de superávit, resultado da receita arrecadada subtraídos
os gastos do governo, é definida todo ano pelo Congresso Nacional, através da
Lei Orçamentária Anual (LOA). Já para a inflação brasileira, a meta anual é de
4,5%, com piso de 3% e teto de 6%.
Esse modelo foi flexibilizado no
segundo mandato do governo Lula, ao ser adotada uma política de caráter mais
expansionista, com estímulo ao crédito, às políticas sociais e habitacionais, e
à redução dos juros. Entretanto, no governo Dilma, o cenário internacional
começou a desacelerar, gerando uma restrição ao desenvolvimento. No seu segundo
mandato, as propostas governamentais não sustentaram o crescimento, a economia
exterior não se recuperou como esperado e o país deparou-se com um agravamento
da crise.
Segundo dados do Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (CODACE), de 2015, o segundo trimestre de 2014 representou o fim de uma expansão
econômica que durou 20 trimestres e sinalizou a entrada do país em recessão. O
crescimento médio trimestral, de 4,2%, havia sofrido uma contração de 1,1% até
o primeiro trimestre de 2015.
Projeções – Para o Fundo Monetário Internacional (FMI), segundo o relatório Fiscal Monitor de outubro de 2016, o Brasil só
atingirá um superávit primário em 2020. A receita precisa superar as despesas
do governo, para então pagar os juros da dívida pública. Entretanto, segundo os
economistas, é difícil fazer projeções estruturais para o país nos próximos
anos.
“O economista que fizer qualquer
projeção estará seriamente afetado pelo mal conhecido como ‘futurologia’. Mas
se raciocinar com hipóteses, ele pode fazer a profecia de que, se a situação
continuar como está, o cenário econômico não mudará nos próximos dez anos”,
enfatiza o economista e doutor em Teoria Econômica Luiz Filgueiras.
Já o economista e especialista em
Financeirização, Ricardo Caffé, acrescenta um agravante para as
próximas décadas. “O envelhecimento da população é uma evidência demográfica
brasileira e, recompor um novo espaço fiscal, uma nova capacidade para a
economia financiar o seu estado e a sua população, é de fato um problema que
sempre foi adiado e não pode mais. Se o Brasil não resolver os seus problemas
fiscais terá problemas de longo prazo”, sustenta.
Percentual da
população idosa brasileira ao longo de décadas (1990-2050)
Reformas – O governo atual tem instituído como alternativas para a saída da
recessão e para um possível crescimento econômico, reformas institucionais. As
iniciativas envolvem a Proposta de Emenda Constitucional do teto dos gastos
públicos (PEC 55), promulgada em dezembro do ano passado, a reforma da Previdência,
tendo como principal mudança o estabelecimento de 65 anos como idade mínima
única para a aposentadoria e a reforma trabalhista, que envolve empregos
temporários e direitos do trabalho.
Para o economista e doutor em
Desenvolvimento Econômico, Uallace Moreira, as reformas devem ser
oportunidades de se promover um crescimento que inclua a população. “O país
pode ter crescimento, mas se não for inclusivo, não há desenvolvimento. Dessa
forma, as reformas: tributária, agrária, política e institucional são
fundamentais para se pensar em um crescimento inclusivo”, defende.
Segundo Caffé, as reformas devem
acontecer, mas não da maneira como estão sendo instituídas pelo governo. “A
situação realmente não está adequada, mas as formas de transformação propostas
estão aliadas à ausência de um debate mais amplo, mais sincero e franco e ao
próprio desinteresse da sociedade. As nossas soluções não têm, neste momento,
uma legitimidade grande e não estão sendo levadas por um projeto maior”,
critica.
Entretanto, para o técnico de
Planejamento e Pesquisa do Ipea, Marco Aurélio Mendonça, as mudanças surtirão
efeito na economia do país. “Uma vez que a reforma [da Previdência] seja
aprovada, as prioridades, provavelmente, serão as discussões acerca de
alternativas para aperfeiçoamentos microeconômicos da economia nacional que
incluem uma reforma trabalhista, a fim de flexibilizar o mercado de trabalho e
promover o crescimento econômico”, afirma na Carta de Conjuntura do Ipea,
número 33.
Mercado de trabalho – Segundo o boletim “Mercado de Trabalho” divulgado pelo Ipea, em outubro
do ano passado, no primeiro semestre de 2016, a taxa de desemprego apresentou
um valor médio de 11,1%, ficando 3 pontos percentuais (p.p.) acima do
verificado para o primeiro semestre de 2015, quando registrou 8,1%.
Diante dos dados e das reformas
atuais, Moreira atesta que o cenário do mercado de trabalho brasileiro é
desfavorável. “Os trabalhadores podem esperar um momento de grande retrocesso,
do ponto de vista de direitos trabalhistas e de direitos previdenciários. A não
ser que esse cenário mude com novas propostas ou com a atuação da própria
sociedade civil”, alerta.
Entretanto, para Caffé, é possível
manter um certo otimismo em relação à reestruturação do país. “A sociedade
brasileira sempre foi criativa, sempre encontrou arranjos para se expandir
e combinar avanços em muitos campos. Essa sociedade que consegue se refazer é o
grande valor do Brasil. A juventude possui também um papel muito importante
nessa realidade, os jovens precisam se sentir mobilizados a construir e dar o
melhor de si”, conclui.
*Estudante do curso de Jornalismo da
Faculdade de Comunicação e repórter da Agência de Notícias em CT&I –
Ciência e Cultura UFBA