Pensando a Educação Infantil nos tempos de pandemia

Multiciência 27 abril 2020

Pensar a Educação Infantil nesse momento de pandemia é pensar nas escolas, em pais, professores e principalmente na criança. É não ter uma resposta pronta, mas tentar refletir sobre possibilidades que nos direcionem a caminhos mais suaves e significativos.

Em um passado não tão distante, a Educação Infantil cumpria um papel meramente assistencialista, entretanto, atualmente, entende-se que esta etapa proporciona práticas que possibilitem aprendizagens, desenvolvimento e socialização. Nesse sentido, os professores planejam, mediam e monitoram tais práticas com objetivo do desenvolvimento integral da criança. Relacionados ao seu desenvolvimento pleno, estão os direitos de aprendizagem, explicitados na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), do Ministério da Educação. Conviver com outras crianças e adultos, brincar, participar ativamente, explorar, expressar-se e conhecer-se propõem infantes interagindo, livres e autônomos.

Mas o papel socializador da escola de Educação Infantil foi banido com o isolamento social, bem como o de mediador do professor. Nesse sentido, a intencionalidade da Educação Infantil não pode ser modificada ou seguir os moldes de outras etapas da educação como o Ensino Médio, onde o foco passa a ser o conteúdo. Em casa, os direitos de aprendizagem e desenvolvimento estão longe de tornarem-se uma realidade. Podemos garantir que nossas crianças convivam com os irmãos, se os tiverem; além da convivência com os adultos da casa. Mas se pensarmos em explorar ou em participar, limitamos nossos pequenos a espaços delimitados e nem sempre possíveis.

Entretanto, a imposição a uma situação de normalidade gera angústia às famílias, aos professores e às crianças. Famílias que se sentem culpadas por não responderem às expectativas produtivas das escolas; professores e professoras que do dia pra noite devem se tornar youtubers e crianças por não entenderem a separação dos colegas, dos avós, das festas de aniversário, dos passeios, da liberdade.

Em dois meses o mundo mudou, a produtividade escolar não tem que seguir o mesmo passo, o produzir está dando espaço ao cuidar, ao proteger. Sem querer romper com as estruturas de poder, algumas escolas de Educação Infantil entendem que devem continuar no mesmo caminho e disponibilizam atividades para as crianças menores de cinco anos. Estas atividades exigem tempo, propõem a condução por um adulto que muitas vezes não possui habilidade pedagógica para mediação e fazem com que a criança fique refém de uma tela que engessa seus movimentos. Mais uma vez pais e professores sentem-se culpados, despreparados e infelizes, sem estrutura emocional para enfrentar os tempos de corona vírus.

A criança, em casa, quer momentos para um outro direito que pontuamos acima, o brincar. Em um brincar livre, espontâneo a criança propõe a sua relação com o mundo. Sua vida é estruturada no brincar, é a resposta que a criança proporciona ao ambientee recebe de volta como aprendizagem.Parece pouco? Mas muitas vezes o brincar não é considerado pelo adulto como aprendizagem formal, e nesse aspecto, acaba sendo desqualificado.

Outra possibilidade bastante interessante neste momento, para as crianças da Educação Infantil, são as atividades de vida prática, presentes na metodologia montessoriana. Pentear o cabelo, colocar a roupa, abotoar, calçar os sapatos, lavar o copo, regar as plantas, varrer o chão, passar pano, entre tantas outras atividades, objetivam o desenvolvimento motor e cognitivo, além da autonomia e prazer dos pequenos.

A partir da experiência como professora de Educação Infantil, pesquisadora, contadora de histórias e mãe, entendo que estamos em um momento de parar e não de seguir em frente no ritmo frenético que pensávamos como melhor para as nossas vidas. Muitas vezes deixamos algo importante para trás em nome do trabalho e do produzir. Tivemos, a força, que dar um tempo. Vamos compreender esse tempo. Nossas crianças não precisam de videoaulas nesse momento. Contações de histórias pontuais podem ser bem vindas, porém vamos dar oportunidade para que nossas crianças sejam crianças de famílias fortalecidas.Enquanto isso, nós, pesquisadores da educação, vamos estudando, aprendendo e procurando respostas para a Educação Infantil em tempos de COVID-19.

Artigo por: Adriana Campana, Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Educação, Cultura e Territórios Semiáridos (PPGESA), professora de Educação Infantil e contadora de história. O artigo foi enviado com exclusividade para Agência MultiCiência.


Ilustração. Melo, estudante de Jornalismo em Multimeios pela UNEB e artista visual. Contato: @aaaeooua