As feiras livres e a mudança de rotina durante a pandemia

Multiciência 06 julho 2021

Barracas dispostas de frutas, legumes, verduras e um aglomerado de pessoas em busca de mercadorias, com sacolas recheadas de compras. Assim é o ambiente das feiras livres, que reúne desde crianças a idosos. Porém, tudo mudou após a pandemia do novo coronavírus (SARS-COV-2).

Por ser um local em que muitas pessoas andam ao ar livre, algumas deixaram o hábito de ir pessoalmente e passaram a adquirir em supermercados que possuem a possibilidade de entrega em domicílio. Como consequência, muitas banquinhas da feira foram fechadas.

(Feira do Alto da Maravilha)

Na feira livre de Juazeiro, localizado no Alto da Maravilha, que ocorre todas as sextas e sábados durante todo o dia, o cenário é de barracas fechadas, as que restaram apontam as dificuldades surgidas após o início da pandemia, sendo a principal delas a queda das vendas. Há mais de 30 anos, Seu Jailson Barbosa trabalha vende gaiolas, passarinhos e rações para pássaros e conta que as vendas diminuíram durante a pandemia da Covid-19.

- As vendas caíram muito, se você olhar, vai ver, fala apontando para as barracas vazias.

Ele relembra que antes não havia barraca vazia, todas elas eram ocupadas por feirantes.

- Com essa pandemia muitos deixaram de trabalhar, outros não tiveram dinheiro para comprar mercadoria para retornar e aí ficou esse “vago”, que tem espaço para muita gente, diz Jailson.

(Jailson Barbosa)

Com a diminuição das vendas, muitos tiveram que se reinventar e não foi diferente para ele. Em sua barraquinha cheia de produtos relacionados à criação de pássaros, uma pequena placa chamou atenção: aceita-se cartões de crédito.

- Meu filho trabalhava com ela e deixou aqui para usar. Eu não usava, mas de uns tempos para cá, estou usando. As vezes querem comprar, aí não “tá” com dinheiro e deixa de comprar... Diminui um pouco o percentual de lucro, mas é um percentual que, às vezes, vale a pena.

Logo no início da pandemia, as feiras livres foram impedidas de serem abertas por conta dos decretos estaduais e municipais. A principal ou única renda desses feirantes teve que ser paralisada para a prevenção e o enfrentamento do vírus. Atualmente mesmo com a liberação, devido à pouca movimentação, muitos ainda precisam completar seu ganho com o que recebem do auxílio emergencial – benefício (Lei nº 13.982/2020), garantido pelo governo brasileiro.

Uma forma encontrada por muitos feirantes para continuar com as vendas quando as feiras livres foram fechadas foi comercializar na praça que fica em frente ao local da feira livre do Alto da Maravilha.  De acordo com seu Jaílson, esse foi um dos métodos encontrados por eles para não passarem necessidade, já que a feira é o que garante o sustento de muitos feirantes que estão ali.

Dona Aldenir Ana da Silva, uma senhora idosa, conta que passou esse período em casa.

- Esse tempo que estava fechado, eu passei em casa. Na minha casa ninguém ia, era tudo em casa, conta Aldenir enquanto debulhava o feijão verde na sua barraquinha.

Sua aposentadoria e a do seu marido foi a única renda para pagar as contas, pois, durante o fechamento, não abriu em nenhum momento.

Apesar da necessidade de um distanciamento social, as barracas não tiveram nenhuma alteração para que ficassem uma mais distante das outras. Além disso, a feira livre do centro não contém pias com água e sabão para a higienização das mãos, em um ambiente que o toque nos produtos é comum. 

(Aldenir e Manoel)

- As barracas estão no mesmo lugar, diz o esposo de dona Aldenir quando foi perguntado se houve alguma mudança no distanciamento entre as barracas.

Como o açougue ao lado da feira está sendo reformado, foram adicionadas ao espaço barracas para a venda de carnes, deixando o local um pouco mais apertado do que antes.

Diferente de dona Aldenir, Sueli, que é feirante há nove anos, sentiu a necessidade de comercializar suas frutas e verduras em casa quando a feira estava fechada. Hoje, com sua barraca cheia de frutas e verduras, a vendedora diz que ainda tem um baixo volume de vendas, mesmo após a retomada das atividades comerciais. Além das vendas em sua residência, ela também contou com o Auxílio Emergencial para complementar a renda.

Já na feira do bairro Alto do Alencar, que acontece todo domingo pela manhã, dona Cleonice, afirma que vendas caíram após a pandemia. Feirante há mais de 20 anos, Cleonice conta que muitos dos seus clientes passaram a comprar mais frutas e legumes em supermercados, justificando ser mais seguro. Além disso, de acordo com ela, os feirantes da cidade não possuem nenhuma associação ou sindicato que representem a classe, e que cada vendedor resolve diretamente com a Agência Municipal de Abastecimento (AMA) as demandas que existem.

Para Dona Fátima Santos, frequentadora das duas feiras, o maior problema é a ausência de cuidados por parte dos consumidores. “Muitos andam sem máscara, e isso assusta quem está se cuidando de verdade”, diz. Além disso, a senhora completou: “até em pegar e escolher as frutas é arriscado por causa de gente descuidada, e querendo ou não, nos supermercados o uso de máscara é obrigatório dentro do estabelecimento”. 

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), em parceria com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento recomenda diversos cuidados que os trabalhadores da agricultura familiar devem tomar a fim de evitar novas contaminações. Como manter uma distância de 1 metro entre uma banca e outra, e entre os vendedores e clientes; as barracas e bancas precisam estar instaladas em locais amplos, de preferência ao ar livre; o espaço precisa disponibilizar de pias com água correntes e álcool 70% para os feirantes e clientes.

Apesar do retorno das feiras, a insegurança de um novo fechamento do comércio é preocupante para os feirantes “após o início dessa doença”, como ressalta Sueli. Mesmo com tantas inseguranças, o trabalho continua se reinventando a cada dia, com a forte esperança de que dias melhores virão.

A equipe de reportagem entrou em contato com Agência Municipal de Abastecimento (AMA) e não obteve resposta.


Reportagem de Vitória Amorim e Vanessa Ramos para Agência Multiciência.